Spinraza: uma novela sem final feliz?

[su_dropcap style=”flat”]E[/su_dropcap] terminou ontem (6/11) mais um capítulo da novela Spinraza. Sem final feliz.

Na pauta da 92ª Reunião da Conitec divulgada ontem era possível ler em linhas telegráficas:

5 de novembro de 2020

Apreciação inicial do nusinersena para tratamento da Atrofia Muscular Espinhal 5q (AME) tipos II e III.

Recomendado o encaminhamento à consulta pública com parecer desfavorável.

A Biogen imediatamente soltou breve comunicado para pacientes com AME 5q e seus familiares sobre o dado novo.

O dirigente da Associação Unidos pela Cura da AME, Renato Travellin, assim se pronunciou sobre o caso:

Conitec sendo Conitec. Sinceramente, vindo deles, não me surpreendeu. É a Conitec contra 40 países com restrições mínimas ou 22 sem nenhuma restrição. Quem tem razão?

A notícia pôs fim às esperanças da comunidade de pacientes e seus familiares. Em 20 de agosto deste ano, ela já havia sido surpreendida com Comunicado distribuído pela Biogen onde esta informava que, em audiência com o Ministério da Saúde (MS), a empresa fora notificada de que: “após explorar diversas alternativas, não foi encontrada solução que viabilizasse a aquisição e dispensação do nursinersena [Spinraza®️] para atender aos pacientes com Atrofia Muscular Espinhal (AME) tipos II e III, tal como originalmente planejado”.

Na ocasião, a empresa havia sido orientada pelo MS a fazer uma nova submissão do medicamento à Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec). E assim foi feito, em operação que teve seu primeiro desfecho desfavorável anteontem.

Seguem-se agora outros passos da via-crucis: consulta pública, recomendação final da Comissão, decisão por parte da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE), eventual contratação de fornecimento, e atualização de Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT).

Assim, se tudo correr bem (o que é improvável), mais uns bons meses de protelação, e de degeneração da condição dos portadores de AME tipo II e III, doença grave, que não pode esperar.

[su_heading size=”18″]Ópera-bufa[/su_heading]

Com a notícia divulgada ontem já se completam 19 meses de expectativas frustradas. Uma trapalhada conduzida pelo governo que levou pacientes e familiares já de todo massacrados por sua condição a uma montanha russa emocional que não se deseja para o pior inimigo.

Acompanhemos os passos da patuscada.

O anúncio da incorporação do Spinraza ao SUS condicionado a acordo de compartilhamento de risco para AME tipo II e III havia sido objeto da Portaria Nº 1.297, de 11 de junho de 2019.

Esta portaria foi publicada porque pacientes e familiares presentes em solenidade no Senado Federal, em 24 de abril de 2019, com a presença do então Ministro da Saúde, Henrique Mandetta (foto), colocaram o guizo no gato.

No momento da assinatura da Portaria, no meio da cerimônia, alguns presentes notaram que ela não mencionava a incorporação do Spinraza ao SUS para AME tipo II e tipo III (mas somente para o tipo I), o que era a expectativa dos pacientes e seus familiares. Constrangimento geral. Como na fábula conhecida, alguém no meio da festa resolvera informar que o Rei estava nu.

Tentando apagar o incêndio, o governo, em manobra bem intencionada, mas talvez precipitada, divulgou, em junho de 2019, a tal portaria visando incorporar o Spinraza para AME tipo II e III mediante acordo de compartilhamento de risco. Foi este acordo que malogrou em agosto deste ano e que agora recebeu seu tiro de misericórdia (ao que tudo indica) com a notícia divulgada ontem.

Depois de algumas reuniões da Biogen com o dirigente da SCTIE, Hélio Angotti Neto (a quem a Conitec se subordina), este informou, no dia 10 de agosto deste ano, que estavam esgotadas as possibilidades de se formalizar um acordo de compartilhamento de risco como planejado inicialmente.

Na ocasião, a Biogen já se pronunciara sobre a reviravolta em comunicado:

É frustrante comunicar este desfecho, considerando que ainda não há outra opção terapêutica disponível para esta subpopulação, mas principalmente, pelo atraso de mais de um ano – prazo desalinhado com as necessidades sociais e clínicas de pessoas que vivem com uma doença neurodegenerativa.

Mas já se sabia que tudo podia dar errado. Antes de retomar as negociações com a SCTIE,  em agosto deste ano, o diretor de assuntos corporativos e acesso ao mercado da Biogen, André Liamas, já havia externado preocupação quanto à viabilidade daquele acordo definido na Portaria de junho de 2019.

Trazer a indústria farmacêutica para compartilhar isso, para fazer parte do processo, é uma possibilidade de garantir acesso e dar transparência à aquisição. Retroagir, nesse momento, é um desastre para a comunidade e para o sistema de saúde.

O ex-secretário da SCTIE e artífice do acordo inovador, Denizar Vianna, previra, antes de deixar a SCTIE, que o ministério poderia ter dificuldades para seguir com a proposta inicial. Um ofício assinado por ele no mês de março deste ano informava:

A demanda pela incorporação de tratamentos inovadores exige coragem para adoção de novas políticas públicas que promovam a cooperação com a indústria farmacêutica e o fortalecimento do sistema público de saúde. A discussão sobre o acordo de compartilhamento de risco e o mero esforço nesse sentido já representa um ganho para o país.

O documento está na resposta ao requerimento de informação feito pelo deputado federal Felipe Rigoni (PSB-ES).

O acordo de compartilhamento de risco já frustrado em agosto deste ano e que ganhou alguma sobrevida até anteontem adquirira característica de promessa política não cumprida e acabou decepcionando a comunidade de AME.

“Realmente foi um marco. Essa proposta foi inovadora, amplamente divulgada e festejada. É muito triste ver essa história que se repete. É aquele ‘ganha mais não leva’. Eu tenho um sentimento de medo de que a gente vai caindo no esquecimento” disse na ocasião Fátima Braga, à frente da Associação Brasileira de Atrofia Muscular Espinhal (Abrame).

Agora é aguardar a Consulta Pública sobre a indicação de Spinraza para AME tipos II e III. Para AME tipo I, tudo parece seguir normalmente.

De acordo com a Biogen, dados de maio obtidos por meio do DATASUS indicavam que a distribuição tem sido feita a cerca de 72 portadores de AME tipo I, já atendida pela incorporação pela via tradicional.

[su_heading size=”18″]Entraves jurídicos[/su_heading]

Os entraves jurídicos que paralisaram e levaram a política de acesso ao fracasso já em agosto deste ano vêm de longe.

Um parecer da Consultoria Jurídica junto ao Ministério da Saúde (Parecer nº 00451/2019/CONJUR-MS/CGU/AGU) obtido por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI) indica que a formalização do acordo seria possível após a recomendação da Conitec, reforçando que o instrumento não poderia ser utilizado na hipótese de ausência de evidências e estudos científicos.

O documento analisava a minuta da Portaria nº 1.297, de 11 de junho de 2019 e foi finalizado na véspera de sua publicação no Diário Oficial da União (DOU). Ou seja, o governo já sabia que havia o risco de problemas jurídicos mais adiante. Mas preferiu tocar o barco.

Uma reportagem publicada em janeiro de 2019 mostrou que outro parecer da Consultoria Jurídica (Parecer nº 01377/2018/CONJUR-MS/CGU/AGU), de 18 de dezembro de 2018, já apontava “grave insegurança jurídica” em caso de aquisição sem o aval da Conitec.

[su_heading size=”18″]Novela que se arrasta[/su_heading]

A incorporação do Spinraza ao SUS para quaisquer indicações já havia sido prometida no final da gestão de Gilberto Occhi (PP), em 2018, e teve oposição de Mandetta (DEM), seu sucessor, que mais tarde assinou Portaria para incorporação ao SUS para AME tipo 1, com pompa e circunstância.

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Com informações adicionais do site Jota, em matéria de autoria de Manoela Albuquerque.

Os tipos de AME

2 comentários em “Spinraza: uma novela sem final feliz?”

  1. Vocês nas audiências tem que fazer somente uma pergunta. E se fosse um filho de vocês?
    Nojo dessa gente, desprezo.
    Quanto vale a vida de um filho.

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  2. Eu realmente fico muito triste porque a doença AME é uma doença mortal,que vai acabando com a pessoa aos pouquinhos até levar a morte. Uma doença cruel pois vai parando todos os seu órgãos até parar de respirar. Que crueldade do ser humano e egoísta tb,onde se tem um remédio que Deus o abençoou a criar pois a permissão é de Deus e estes homens que poderiam ser denominados anjos por criarem uma medicação Spinraza que traz a cura , eles se tornam demônios pessoas do mal, tenho certeza que Deus não está feliz com está situação deu a eles o poder para o bem,eles usam para o mal. Infelizmente vcs que estão tirando a vidas de muitas pessoas ,posso chama los de assassinos, palavra forte né, mais e as pessoas que estão perdendo a vida por falta deste medicamento, suas famílias exaustas de tanto lutar e tanta mentira,com ansiedades e depressão de tanto esperar por essa cura e essa indecisão destes governantes que hora libera hora não libera
    O castigo de Deus vai acontecer não tenho dúvida,porque ter a cura nas mãos e tirar ela das famílias e muito cruel.
    Vcs não tem ideia o que estão provocando em Deus sua irá, ela e cruel.
    Peço que revejam isso e que tenham misericórdia das nossas famílias que sofrem tanto pelos seu entes queridos doentes.
    Liberem este remédio Spinraza pelo amor de Deus.
    Sou mãe de uma garotinha com AME 3.

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