Post atualizado às 14h de 31/7/2020.
[su_dropcap style=”flat”]N[/su_dropcap]a quarta-feira passada (29/7) mostramos a vocês que alguns países já começam a rever suas Avaliações de Tecnologia em Saúde (ATS) para entregar medicamentos para doenças raras a seus cidadãos. Isto porque os métodos convencionais de ATS tendem a prejudicar pessoas que vivem com doenças raras, causando sérios problemas de equidade, que, ironicamente, é a menina dos olhos do SUS.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS),
[su_note]Atenção: toda vez que você ler a abreviatura TDR no texto entenda como “tratamento para doenças raras (e ultrarraras)” [/su_note]
Relembrando: Estudo recente realizado com 32 países, sendo que a maioria integrantes da União Européia, além de Canadá e Nova Zelândia, verificou que 41% deles (ou seja, 13 países) adotam algum processo complementar de ATS envolvendo TDR. A grande maioria das pessoas consultadas (80%) era estreitamente envolvida com tais processos no serviço público de seus respectivos países. O restante eram pessoas do meio acadêmico, prestadores de serviços de saúde ou setor privado. Para os efeitos do estudo, doenças raras foram definidas como aquelas que acometem menos de 5 a cada 10 mil pessoas.
No estudo, os pesquisadores basicamente se concentraram em duas questões:
- qual o nível de integração destes processos àqueles convencionais já empregados, e
- quais seriam as características únicas e/ou distintas destes processos complementares com relação às ATS convencionais.
Vamos detalhar um pouco para você o que estão fazendo estes 13 países.
Uma observação: os países da União Européia costumam chamar de “reembolso” (reimbursement) o que aqui no Brasil denominamos incorporação de tecnologias ao SUS (por exemplo). Assim, toda vez que você ler aqui embaixo reembolso ou congêneres, estamos descrevendo processos de incorporação de tecnologias aos sistemas públicos de saúde.
Agora, você precisa entender a classificação adotada pelos pesquisadores para estes processos de ATS que eles investigaram.
[su_label type=”important”]Separado[/su_label] Processo em separado com comitês de avaliação e exigências de evidências distintas daquelas das ATS convencionais e com adaptações para melhor lidar com as especificidades dos tratamentos para doenças raras.
[su_label type=”important”]Parcialmente separado[/su_label] Diferentes itinerários dentro de uma ATS convencional, mesmo comitê de avaliação, mas com regras/abordagens distintas e adaptações para melhor lidar com os tratamentos para doenças raras.
[su_label type=”important”]Adaptado[/su_label] Mesmo percurso da ATS convencional com adaptações para melhor dar conta das especificidades das terapias para doenças raras.
[su_label type=”important”]Acelerado[/su_label] ATS convencional simplificada, menos exigências, início mais precoce de avaliação e reembolso, decisões mais ágeis, acesso mais rápido.
[su_label type=”important”]Ponderado para raridade[/su_label] A raridade, como tal, é considerada como critério de decisão no status do reembolso ou determinação da disposição a pagar pela terapia para doenças raras.
[su_label type=”important”]Sem ATS para TDR[/su_label]
Por estes critérios, os 13 países se dividiram assim (clique no sinal de + para saber mais):
[su_spoiler title=”Separado” style=”fancy”]Inglaterra e Lituânia[/su_spoiler]
[su_spoiler title=”Parcialmente separado” style=”fancy”]Escócia e Alemanha[/su_spoiler]
[su_spoiler title=”Adaptado” style=”fancy”]Noruega, Suécia e Eslováquia[/su_spoiler]
[su_spoiler title=”Acelerado” style=”fancy”]Romênia e Eslováquia[/su_spoiler]
[su_spoiler title=”Sem ATS para TDR” style=”fancy”]Letônia e Bulgária[/su_spoiler]
Agora vamos a algumas curiosidades sobre os processos de ATS para doenças raras nestes países.
[su_label type=”important”]Separado[/su_label]
Este é o caso do programa Highly Specialized Technologies (HST) da Inglaterra voltado para doenças ultrarraras, da mesma forma que o da Lituânia. Ambos também incluem características diferentes destinados a se adaptar melhor às especificidades dos TDR. No Brasil, doença ultrarrara é aquela que acomete uma pessoa a cada 50 mil habitantes. Curiosamente, estas são as doenças raras mais judigitalizadas no País, como mostramos no post anterior. Ambos os países acima mencionados (Inglaterra e Lituânia) reconhecem os desafios para a geração de evidências nestes casos e tendem a ser mais flexíveis em sua interpretação.
O programa HST na Inglaterra possui uma estrutura de tomada de decisão explícita que permite uma consideração mais ampla do valor do tratamento. Nesta abordagem de valor incluem-se “natureza da condição”, “eficácia clínica”, value for money, “impacto além dos benefícios diretos à saúde” e maior disposição a pagar.
Já o itinerário para doenças ultrarraras da Lituânia possui regras de avaliação diferentes (valor terapêutico não padronizado), uma lista de reembolso especial sem lista de espera e regras especiais de preços.
[su_label type=”important”]Parcialmente separado[/su_label]
Os processos complementares parcialmente integrados às ATS convencionais incluem o itinerário para doenças ultrarraras na Escócia e na Alemanha.
Na Escócia a estrutura mais ampla de tomada de decisão implementada em 2016 foi alterada para uma via específica para se avaliar TDR. Lá, uma vez que um produto é classificado como voltado para TDR pelo Scottish Medicines Consortium (SMC), ele é submetido a este mesmo consórcio para avaliação inicial, usando-se um formulário de envio especial.
Lá também este medicamento, antes mesmo de sua aprovação definitiva, será condicionalmente disponibilizado aos pacientes por três anos, com um plano de coleta de evidências e posterior reavaliação de sua situação passado este período.
Na Alemanha, as avaliações são conduzidas pelo Comitê Conjunto Federal (G-BA) em vez do Instituto independente de Qualidade e Eficiência na Assistência à Saúde (IQWiG). As TDR também estão sujeitas a requisitos probatórios mais simplificados (por exemplo, não há necessidade de dados comparativos com outras tecnologias) e o benefício adicional desta terapia é considerado automaticamente comprovado. Há também uma opção para aprovação condicional (c0mo na Escócia).
[su_label type=”important”]Adaptado[/su_label]
Os países foram definidos como tendo processos adaptados para TDR quando incluem ajustes em seus processos-padrão que permitem melhor gerenciamento dos desafios por elas representados.
É o caso da Noruega, Suécia e Eslováquia, em que o processo adaptado é direcionado às TDR voltadas para doenças ultrarraras, e, na Escócia, aos medicamentos órfãos em geral. Os principais recursos do processo comuns a todos estes países estão relacionados a uma maior compreensão dos desafios para produzir evidências de alta qualidade para as TDR e a um reembolso mais favorável por meio de uma Disposição a Pagar mais elevada.
A Eslováquia também não exige dos demandantes das TDR a apresentação de uma avaliação econômica. Na Escócia, o fato de uma TDR ser considerada um medicamento órfão é visto como um “modificador” do processo de avaliação há muitos anos, o que proporciona mais flexibilidade no processo de tomada de decisão.
Mais recentemente, a Escócia oferece também uma possibilidade de se realizar uma reunião de engajamento de pacientes e clínicos (PACE) para os medicamentos órfãos num programa denominado Patient and Clinician Engagement (PACE).
[su_label type=”important”]Acelerado[/su_label]
Cinco dos 13 países com processos complementares às ATS convencionais para TDR possuem um alto nível de integração entre ambos. Nestes casos, incluem-se os processos acelerados ou onde a raridade é ponderada. Os três países com processos acelerados (Itália, Bélgica e Nova Zelândia) permitem um início mais precoce do processo de avaliação (e, consequentemente, acesso mais ágil dos pacientes a esses tratamentos).
[su_label type=”important”]Ponderado para raridade[/su_label]
Dois países possuem sistemas de pontos (como uma bonificação) para determinar o status do reembolso (Romênia) e Disposição a Pagar (Eslováquia). Neles, os medicamentos órfãos recebem pontos-extra.
[su_label type=”important”]Sem ATS para TDR[/su_label]
Letônia e Bulgária estão entre os 13 países com processos de ATS complementares às avaliações convencionais que não exigem ATS para TDR. Na Letônia, por exemplo, existe um orçamento à parte de reembolso para crianças que vivem com doenças raras. Já a Bulgária possui uma lista de doenças raras para as quais os medicamentos são automaticamente reembolsados, sem maiores condicionantes.
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