Cláudio Cordovil

O Lado Oculto do Teste do Pezinho: Os Desafios Silenciados

Imagine que o teste do pezinho, um exame que bebês fazem logo após nascer, seja como um super-herói que pode descobrir doenças raras antes mesmo delas mostrarem sinais. Isso ajuda os médicos a começar o tratamento cedo, o que pode ser muito importante para a saúde do bebê. Mas, como em muitas histórias de super-heróis, existem desafios a enfrentar.

Um dos problemas é que nem sempre é fácil saber quem realmente precisa desse “superpoder”. Alguns bebês podem ter uma versão tão leve da doença que o tratamento desde cedo pode não ser necessário. Mas, sem uma forma clara de prever isso, muitos acabam sendo tratados de qualquer maneira, o que pode levar a tratamentos ou dietas especiais por toda a vida, mesmo que desnecessários.

Outro ponto complicado é como saber se o teste do pezinho é realmente eficaz. Normalmente, os cientistas fazem experimentos chamados estudos randomizados para descobrir isso, mas, com doenças tão raras, isso fica difícil de realizar. Além disso, uma vez que o teste se torna comum, não seria justo (ou ético) não oferecê-lo a algumas crianças só para ver o que acontece. Por isso, os especialistas preferem observar e comparar grupos de bebês que fizeram o teste com aqueles que não fizeram, para entender melhor os benefícios. Contudo, até isso tem seus problemas. Por exemplo, se um grupo tem melhores resultados, pode ser porque o teste realmente ajuda, ou simplesmente porque as doenças desse grupo não eram tão graves.

Avaliar os problemas que o teste do pezinho pode causar também não é fácil. Coisas como o estresse dos pais ao receber um diagnóstico ou tratamentos desnecessários são difíceis de medir. Então, os pesquisadores também olham para estudos de opinião e entrevistas para entender esses efeitos.

Embora a Triagem Neonatal (ou teste do pezinho) seja celebrada por suas capacidades de salvar vidas ao detectar precocemente doenças raras em recém-nascidos, pouco se discute sobre os desafios e implicações que acompanham essa prática. Neste post, mergulharemos nos problemas menos conhecidos do teste do pezinho, desde o estresse emocional vivenciado pelas famílias até as complexidades éticas e operacionais que cercam seu uso, revelando o lado oculto de um dos exames mais comuns na pediatria.

Além de todos esses desafios técnicos e éticos, ainda existe o problema de organizar toda essa informação de maneira eficaz. Atualmente, muitos países, inclusive os Países Baixos, não têm uma boa estrutura para coletar e analisar esses dados de forma contínua e uniforme.

Os especialistas sugerem que é muito importante continuar acompanhando os bebês que fazem o teste para coletar informações não só sobre os benefícios, mas também sobre os possíveis problemas que o teste pode causar. Eles também falam sobre a importância de trabalhar juntos internacionalmente, o que pode ajudar a aprender mais rápido, especialmente sobre doenças muito raras.

No fim das contas, o desafio é garantir que o teste do pezinho, nosso super-herói da saúde dos bebês, seja usado da melhor forma possível. Isso significa entender bem seus poderes e limitações para ajudar verdadeiramente as crianças que precisam, sem causar preocupações ou tratamentos desnecessários.

Problemas e Desafios da Triagem Neonatal

A Triagem Neonatal (TN), apesar de ser uma ferragem poderosa na detecção precoce de doenças raras em recém-nascidos, pode apresentar alguns problemas e desafios:

  1. Tratamentos e dietas desnecessárias: Como a TN pode identificar casos de doenças com manifestações muito leves ou até mesmo assintomáticos, alguns bebês podem acabar sendo submetidos a tratamentos ou dietas especiais por toda a vida, sem que houvesse uma necessidade real para isso.
  2. Ansiedade dos pais: O processo de triagem pode gerar ansiedade e estresse nos pais, especialmente se o resultado inicial indicar a possibilidade de uma doença. Essa preocupação pode ser ampliada até que testes adicionais confirmem ou descartem a condição.
  3. Falso-positivos e falso-negativos: Nenhum teste é perfeito. Um resultado falso-positivo ocorre quando o teste indica que o bebê tem uma doença quando na verdade não tem, podendo levar a mais testes desnecessários e ansiedade. Por outro lado, um falso-negativo, onde o teste não detecta a doença que a criança realmente tem, pode atrasar o diagnóstico e o tratamento necessários.
  4. Custo-benefício e recursos: Embora a TN seja crucial, o custo e os recursos necessários para implementar programas de triagem abrangentes podem ser significativos. Isso inclui não apenas o custo dos testes em si, mas também o seguimento necessário para confirmar diagnósticos e o tratamento subsequente.
  5. Desafios éticos: Uma vez que a TN se torna uma prática padrão, surgem dilemas éticos relacionados a quem deve ou não ser testado e como gerenciar os resultados. Além disso, a inclusão de doenças com tratamentos menos claros ou benefícios de intervenção precoce questionáveis pode complicar a decisão dos pais sobre participar da TN.
  6. Gerenciamento de dados e privacidade: A coleta, armazenamento e análise de dados sensíveis de saúde dos recém-nascidos levantam questões importantes sobre privacidade e segurança. A conformidade com regulamentos como o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (GDPR) da União Europeia é essencial, mas também pode dificultar a pesquisa e o compartilhamento de informações importantes para a melhoria dos programas de TN.
  7. Necessidade de acompanhamento e infraestrutura de pesquisa: A falta de uma infraestrutura nacional ou internacional para acompanhar de forma contínua e sistemática os resultados da TN e os desfechos de longo prazo dos pacientes dificulta a avaliação da eficácia dos programas e o ajuste das práticas conforme necessário.

Portanto, enquanto a TN oferece muitos benefícios potenciais, é importante abordar esses possíveis problemas através de políticas cuidadosas, práticas baseadas em evidências e a participação ativa de todas as partes interessadas (stakeholders), incluindo profissionais de saúde, pesquisadores, gestores e, claro, as famílias afetadas.


Para saber mais: Kalkman, S., Wevers, R.A., Wijburg, F.A. et al. A framework for evaluating long-term impact of newborn screening. Eur J Hum Genet 32, 146–149 (2024). https://doi.org/10.1038/s41431-023-01469-8

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