“Bocas inúteis”: Programa de ‘Eutanásia’ nazista exterminou milhares de pessoas com deficiência

Fatos-chave

1) O termo “eutanásia” significa literalmente “boa morte”. Geralmente se refere a causar morte indolor a um indivíduo que tenha doença crônica ou terminal que, de outra forma, sofreria com o avanço da doença.

2) No contexto nazista, no entanto, “eutanásia” foi um termo eufemístico ou indireto para um programa de assassinato clandestino.

3) O programa de “eutanásia” teve como alvo de assassinato sistemático os pacientes com deficiências físicas e mentais que viviam em ambientes institucionais na Alemanha e em territórios anexados à Alemanha.

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O objetivo do programa de eutanásia nazista foi o de eliminar pessoas com deficiências físicas e mentais. Na visão nazista, tais ações “limpariam” a raça “ariana” de pessoas consideradas geneticamente defeituosas e que eles consideravam um fardo financeiro para a sociedade.

O Primeiro Programa de Extermínio em Massa da Alemanha Nazista

O Programa de Eutanásia foi o primeiro programa de extermínio em massa da Alemanha nazista. Ele se antecipou ao genocídio do judaísmo europeu (o Holocausto) por aproximadamente dois anos. O programa foi uma das muitas medidas eugênicas radicais que visavam restaurar a “integridade” racial da nação alemã. O objetivo era extinguir o que os eugenistas e seus defensores consideravam uma “vida indigna de ser vivida”, ou seja, aqueles indivíduos que os nazistas acreditavam  representar um ônus, tanto genético quanto financeiro, para a sociedade e o Estado alemães devido às suas graves deficiências psiquiátricas, neurológicas e/ou físicas.

Programa de “Eutanásia” infantil

Nos meses da primavera e o verão de 1939, os nazistas começaram a organizar uma operação secreta de assassinatos de crianças deficientes. Eles foram liderados por Philipp Bouhler, diretor da chancelaria privada de Hitler, e Karl Brandt, médico assistente de Hitler.

Em 18 de agosto de 1939, o Ministério do Interior do Reich fez circular um decreto exigindo que todos os médicos, enfermeiros e parteiras denunciassem os recém-nascidos e crianças com menos de três anos de idade que apresentassem sinais de incapacidade mental ou física grave.

A partir de outubro de 1939, as autoridades de saúde pública começaram a incentivar os pais de crianças com deficiência a colocarem seus filhos em uma das várias clínicas pediátricas indicadas pelas autoridades nazistas na Alemanha e na Áustria. Na realidade, aquelas clínicas eram locais de assassinato infantil. Nelas, uma equipe médica especialmente recrutada assassinava aquelas crianças sob seus cuidados com overdoses letais de medicação ou as deixavam morrer por inanição.

Inicialmente, os profissionais da área médica e os administradores das clínicas assassinavam apenas bebês e crianças pequenas. À medida que a medida se ampliou, eles passaram a incluir jovens de até 17 anos de idade em suas ações. Estimativas conservadoras sugerem que pelo menos 5.000 crianças alemãs com deficiências físicas e mentais foram assassinadas pelos membros do programa de “eutanásia” infantil durante os anos da Guerra.

A Ampliação do Programa de “Eutanásia”

Os planejadores do programa de eutanásia logo pensaram em levar o programa de matança aos pacientes adultos com deficiências que viviam em ambientes institucionais. No outono de 1939, Adolf Hitler assinou uma autorização secreta para proteger os médicos participantes, as equipes médicas e os administradores contra possíveis processos judiciais. A data desta autorização foi retroativa a 1 de setembro de 1939, para dar a parecer que o esforço macabre estava relacionado às medidas de guerra.

A Chancelaria do Führer era pequena e independente do Estado, do governo e do aparato do Partido Nazista. Por estas razões, Hitler escolheu-a para servir de motor para a campanha de “eutanásia”. Os funcionários do programa denominaram suas atividades secretas como Programa “T4”. Tal codinome era uma referência ao endereço do seu escritório coordenador em Berlim: rua Tiergartenstrasse 4.

De acordo com a diretriz de Hitler, o diretor da Chancelaria do Führer, Phillip Bouhler, e o médico Karl Brandt lideraram as operações de assassinato. Sob sua liderança, os agentes do T4 estabeleceram seis instalações de gaseamento para adultos como parte da ação de “eutanásia”. Elas eram:

  • Brandenburg, no rio Havel, perto de Berlin
  • Grafeneck, no sudoeste da Alemanha
  • Bernburg, na Saxônia
  • Sonnenstein, também na Saxônia
  • Hartheim, perto de Linz, no Danúbio, na Áustria
  • Hadamar, em Hessen

Utilizando uma prática desenvolvida para o programa de “eutanásia” infantil, no outono de 1939 os organizadores da T4 começaram a distribuir questionários cuidadosamente formulados para todas as autoridades na área de saúde pública, hospitais públicos e privados, instituições para cuidados mentais e casas de saúde para doentes crônicos e/ou idosos. O espaço limitado e a redação dos formulários, assim como as instruções na carta de endereçamento, combinavam-se para dar a impressão de que a pesquisa se destinava simplesmente a obter dados estatísticos.

Apenas a ênfase dada à identificação da capacidade de trabalho dos pacientes, bem como as categorias colocadas no formulário, poderiam levantar alguma suspeita sobre o objetivo sinistro daquela pesquisa. As categorias de pacientes eram:

  • aqueles que sofrem de esquizofrenia, epilepsia, demência, encefalite e outros transtornos psiquiátricos ou neurológicos crônicos
  • aqueles que não são de sangue alemão ou “derivado”
  • os criminosos insanos ou aqueles presos por motivos criminais
  • aqueles confinados à instituição há mais de cinco anos

“Peritos médicos” recrutados secretamente, médicos – muitos deles com boa reputação – trabalhavam em equipes de três profissionais para responder aos formulários. A partir de janeiro de 1940, baseados em suas decisões, os funcionários do T4 começaram a remover de suas instituições de origem os pacientes que haviam sido selecionados para o programa de “eutanásia”. Os pacientes eram transportados por ônibus ou trem para uma das instalações centrais de assassinato por axfixiamento por gás.

Poucas horas após sua chegada a tais centros, as vítimas eram mortas nas câmaras de gás, que eram disfarçadas como se fossem banheiros, usando monóxido de carbono. Funcionários do T4 então incineravam os corpos em crematórios ligados às instalações de gaseamento. Outros trabalhadores pegavam as cinzas das vítimas cremadas, de uma pilha comum, e as colocavam em urnas funerárias para serem enviadas aos familiares das vítimas. As famílias, ou aqueles responsáveis pelas vítimas, recebiam as urnas fúnebres juntamente com uma certidão de óbito e uma documentação que indicava sua causa fictícia, bem como a data da morte.

Como o programa era secreto, os planejadores e funcionários do T-4 executavam medidas elaboradas para ocultar seus projetos assassinos. Embora os médicos e os administradores institucionais falsificassem os registros oficiais para indicar que as vítimas morreram por causas naturais, o programa de “eutanásia” rapidamente se tornou amplamente conhecido pelo público. Protestos públicos e privados sobre os assassinatos passaram a acontecer, especialmente por parte de membros do clero alemão.

Dentre os clérigos estava o bispo de Münster, Clemens August Count von Galen. Ele protestou contra os assassinatos do T-4 em um sermão no dia 13 de agosto de 1941. No final de agosto de 1941, tendo em vista o fato de que o público havia tomado conhecimento do programa e protestado de forma pública e privada, Hitler ordenou a suspensão do mesmo.

De acordo com os próprios cálculos internos do T4, entre janeiro de 1940 e agosto de 1941, o programa de eutanásia assassinou 70.273 pessoas física e mentalmente incapacitadas naquelas seis instalações de assassinato por asfixia

“Deus não há de querer que os doentes se reproduzam”


Fotografia com a legenda: “… Deus não há de querer que os doentes se reproduzam.”

A origem dessa imagem é um filme produzido pelo Ministro da Propaganda do Reich que tentou, através da propaganda, desenvolver a aceitação pública para o Programa de Eutanásia.

Fonte: US Holocaust Memorial Museum

Segunda Fase

No entanto, a ordem de Hitler para a suspensão da ação do T4 não significou o fim da operação de eutanásia. Os assassinatos de crianças continuaram normalmente e, além disto, em agosto de 1942, os medicos alemães e outros profissionais de saúde retomaram os assassinatos, embora de maneira mais dissimulada. O programa tornou-se mais descentralizado que em sua fase inicial, e o esforço renovado passou a depender das exigências regionais, com as autoridades locais determinando o ritmo do extermínio.

Esta segunda fase, para ser menos evidente, passou a utilizar overdose de drogas e injeções letais – já usadas com sucesso na eutanásia de crianças – e foi retomada em uma ampla variedade de instituições por todo o Reich. Muitas dessas instituições também sistematicamente impediam as vítimas, adultas e infantis, de se alimentarem, para que morressem de inanição.

O Programa de Eutanásia continuou até os últimos dias da Segunda Guerra Mundial, havendo sido inclusive expandido para incluir uma variedade cada vez maior de vítimas, dentre elas pacientes idosos, feridos vítimas dos bombardeios e trabalhadores estrangeiros escravizados. Os historiadores avaliam que o Programa de Eutanásia, em todas as suas fases, tirou a vida de 250 mil pessoas.

Ônibus que transportaram pacientes de um hospital próximo a Wiesbaden para o centro de eutanásia Hadamar.



Um dos ônibus que transportavam pacientes de um hospital próximo a Wiesbaden para o centro de eutanásia em Hadamar, onde eram envenenados por gás ou mortos com injeção letal. Alemanha, entre maio e setembro de 1941.
Fonte: Hessisches Hauptstaatsarchiv Wiesbaden

Pessoas com Deficiências no Leste Europeu Ocupado pela Alemanha

Na região do leste da Europa ocupado pelos alemães, as pessoas com deficiências também foram vítimas deste tipo de violência. Os alemães confinaram o Programa de Eutanásia, que começou como uma medida de higiene racial, ao próprio Reich – isto é, aos alemães da Alemanha e dos territórios anexados da Áustria, Alsácia-Lorena, Protetorado da Boêmia e Morávia e Warthegau, na antiga Polônia.

No entanto, a convicção ideológica nazista que rotulava tais pessoas como “indignas de viver” tornou os pacientes institucionalizados, poloneses e soviéticos, em alvos de ações de fuzilamento. Naquela área da Europa, os assassinatos de pacientes com deficiência eram tarefa das forças das SS e da polícia, e não dos médicos, profissionais de saúde  e administradores do T4 que que haviam implementado o Programa de Eutanásia.

Em áreas da Pomerânia, Prússia Ocidental e da Polônia ocupada, as unidades das SS e unidades policiais assassinaram cerca de 30.000 pacientes no outono de 1941, com o objetivo de criar espaço para acomodação dos colonos de etnia alemã (Volksdeutsche), que haviam sido levados dos Países Bálticos e de outras áreas para aquelas regiões.

As SS e as unidades policiais também assassinaram pacientes com deficiências através de fuzilamento em massa e em veículos a gás nos territórios soviéticos ocupados. Milhares mais morreram em suas camas e enfermarias, assassinados por membros das SS e das unidades policiais auxiliares na Polônia e na União Soviética. Tais assassinatos careciam do componente ideológico atribuído ao programa centralizado de eutanásia [que queria manter “limpo o sangue alemão”]. As ações das SS para o assassinato de pacientes institucionalizados na Polônia ocupada e na União Soviética, aparentemente foram motivadas por preocupações de ordem econômica e material.

As SS e a Wehrmacht rapidamente tomaram os hospitais esvaziados nessas operações de extermínio e os transformaram em quartéis, hospitais para os alemães e depósitos de munições. Em casos raros, as SS utilizaram as instalações vazias como local formal do T4 para assassinato. Um exemplo, é a instalação da eutanásia em Tiegenhof, perto de Gnesen (hoje Gniezno, na região centro-oeste da Polônia).

A Significância do Programa de Eutanásia

O Programa de Eutanásia foi, de várias maneiras, um treino para as subsequentes políticas genocidas da Alemanha nazista. A liderança nazista estendeu a justificativa ideológica criada pelos médicos para a destruição dos “inaptos” a outras categorias de inimigos biológicos imaginários, principalmente judeus e ciganos.

Os planejadores da “Solução Final” posteriormente utilizaram as câmaras-de-gás e os crematórios adjacentes, especificamente projetados para a campanha do T4, para o assassínio de judeus na área da Europa ocupada pelos alemães. Os funcionários do T4 que haviam se mostrado confiáveis durante a execução do primeiro programa de extermínio em massa, figuravam em destaque junto ao pessoal alemão estacionado nos centros de extermínio da Operação Reinhard, em Belzec, Sobibor e Treblinka.

Como aqueles que planejaram a aniquilação física dos judeus europeus, os planejadores do Programa de Eutanásia queriam criar uma sociedade racialmente pura e produtiva. Eles adotaram estratégias radicais para eliminar aqueles que não se encaixam em sua visão.

Centros de “eutanásia”, Alemanha 1940-1945

Na terminologia nazista, “eutanásia” referia-se ao extermínio sistemático dos alemães que os nazistas consideravam “sem direito à vida” devido a supostas doenças genéticas e/ou defeitos físicos ou mentais. No outono de 1939, foram criadas instalações para iniciar o processo de eliminação em massa daquelas pessoas utilizando o método de envenenamento por gás.

Os prédios para tal ação estavam localizados em Bernburg, Brandenburg, Grafeneck, Hadamar, Hartheim e Sonnenstein. Os pacientes eram selecionados pelos médicos [que deveriam tratá-los] e transferidos das clínicas onde estavam internados para uma daquelas instalações centralizadas de assassinato.

Depois que a indignação pública forçou o fim daquelas matanças, os médicos passaram a aplicar injeções letais em pessoas selecionados para “eutanásia” em clínicas e hospitais espalhados por toda a Alemanha. Desta forma, o programa de “eutanásia” continuou a funcionar e a expandir-se até o final da Guerra.

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