Cláudio Cordovil

A árvore e a floresta: Spinraza e o futuro da terapia gênica

AME, Spinraza, terapia gênica

A notícia mais importante nas últimas semanas, no campo das doenças raras, tem a ver com o Spinraza (nusinersena), que é a primeira e até o momento única medicação indicada para Atrofia Muscular Espinhal (AME), a principal causa genética de mortalidade infantil, segundo a revista Nature. Em um curto intervalo de tempo, o NICE e a Conitec decidiram por sua não aprovação/recomendação. O ponto nevrálgico para esta decisão tem sido seu preço astronômico: Setenta e cinco mil libras (cerca de 368 mil reais) por dose, excluindo impostos. Com este preço, o custo anual do tratamento é de 450 mil libras (cerca de 2,2 milhões de reais) para o primeiro ano; e 225 mil libras (1,1 milhão de reais) para os anos seguintes.

No comunicado emitido pelo NICE para justificar sua decisão, o instituto diz  que a evidência revelou “um substancial benefício da nusinersena”, ao mesmo tempo em que destaca “incertezas significativas”, principalmente no que se refere a  “benefícios de longo prazo”, o que tornaria difícil justificar seu preço “extremamente elevado”. Já o plenário da Conitec, reunido no início de agosto deste ano, indicou que o tema fosse encaminhado para consulta pública com recomendação preliminar desfavorável à incorporação no SUS,  para tratar crianças com AME 5q tipo I”.

Na visão da Conitec, as evidências clínicas apresentadas foram “frágeis” e os resultados não demonstrariam “aumento de sobrevida para além da expectativa de vida esperada para crianças com a doença”. Por sua vez, no mesmo relatório, a análise de custo-efetividade, nossa velha conhecida, teria mostrado que  “o medicamento não apresenta resultados clínicos condizentes com o preço praticado”. Já  a análise de impacto orçamentário, “que prevê gastos na ordem de R$ 1 bilhão”, evidenciaria que, se incorporado ao nosso sistema público de saúde, a nusinersena poderia “comprometer a sustentabilidade do SUS”.

 

A sabedoria popular  sustenta que, ao observarmos muito uma árvore singular, corremos o risco de perder de vista a vastidão da floresta. Até o momento, todos os que resolveram debater o tema no Brasil se detiveram na contemplação da árvore. De fato, a  decisão foi tida como devastadora, compreensivelmente, entre as famílias de brasileiros vivendo com AME. No momento em que este post está sendo redigido, muitas manifestações de repúdio à decisão já percorreram o País e a consulta pública sobre o tema, aberta pela Conitec, até ontem revelava a impressionante marca de 37 mil contribuições, fato absolutamente inédito na história desta Comissão.

Mas, paremos por um instante para contemplarmos a floresta. A nusinersena é um dos primeiros produtos derivados da terapia gênica. A Humanidade tem depositado há algumas décadas grandes esperanças nesta nova modalidade tecnológica, bem como nas terapias teciduais e celulares, estas últimas ligadas às conquistas derivadas das pesquisas com células-tronco. Tecnologias como a nusinersena acenam com a promessa de erradicar doenças até então tidas como incuráveis, com uma dose única de tratamento ou com um esquema terapêutico de curta duração.

Em suas mais variadas formas, a terapia gênica é tida como uma das mais relevantes conquistas da história da medicina no que se refere ao tratamento de pessoas nascidas com doenças genéticas incuráveis. A cultura de massa e a indústria do entretenimento ao longo de décadas têm nutrido nossos corações e mentes de esperança no que se refere a estas terapias.

Não é trivial nem desprezível o montante de recursos investidos em todo o mundo para a terapia gênica e outras modalidades avançadas. O que pouca gente conhece é a força do advocacy promovido por estes pacientes na busca de uma cura para tais doenças. Não fosse o financiamento destas pesquisas com dinheiro vindo do bolso de muitos familiares destes pacientes, não teríamos como comemorar conquistas tão relevantes em termos de engenho humano em tão curto espaço de tempo. Relatório da Association of Medical Research Charities, publicado em 2014, mostrou que, de forma coletiva, entidades beneficentes de médio e pequeno porte, muitas das quais prestando auxílio a pacientes com doenças raras, contribuem com cerca de um terço dos investimentos na pesquisa e desenvolvimento de tratamentos ligados a terapias gênicas e celulares.

Dezenas de milhares de pacientes em todo o mundo têm contribuído como sujeitos de pesquisa ao longo de três décadas para a realização de testes clínicos destes medicamentos, num esforço corajoso e considerável. Nesta trajetória, com marcos regulatórios robustos, já vimos de tudo, desde eventos adversos (entre estes a trágica morte de Jesse Gelsinger em 1999), até resultados positivos.

O ritmo da inovação no campo da terapia gênica tem sido frenético. Basta dizer que se passaram somente cinco anos entre a primeira dose de nusinersena em humanos até sua primeira aprovação regulatória em 2016. Mas, ao cabo e ao resto, como dizem nossos amigos portugueses, o que importa é se tais tecnologias chegarão ao mercado com preços viáveis, razoáveis e acessíveis. Invariavelmente, este não tem sido o caso. E aqui a batalha passa a ser de todos os cidadãos do planeta e não somente dos familiares de pacientes vivendo com AME.

De fato, alguns produtos derivados da terapia gênica já tiveram sua comercialização suspensa na Europa devido aos seus custos astronômicos e à falta de uma engenharia comercial que os integrasse aos cada vez mais comprometidos orçamentos de sistemas de saúde pública ocidentais. Grande parte deste comprometimento é derivado do avanço tecnológico e do envelhecimento generalizado da população mundial. O progresso tecnológico, na verdade, tem sido vítima de seu próprio sucesso.

A esta altura não há mais dúvidas de que a quantidade de produtos derivados de terapia gênica a buscar licenciamento irá aumentar e de que a demonstração do potencial destas terapias é inequívoco e um caminho sem volta. Ainda assim, o mantra dos preços acessíveis, razoáveis e justos entoado pelos reguladores irá continuar a assombrar as mentes dos investidores mais afoitos.  O compromisso de financiadores, o empenho de pesquisadores e investidores e, especialmente, a coragem de sujeitos de pesquisa voluntários ao longo destas três décadas não podem ser jogados fora. Seria como abandonar uma obra faraônica pela metade, com os custos ainda mais astronômicos se forem retomadas em futuro incerto.

Diante disso, o que deve ser feito? Como a Humanidade pode se beneficiar deste maravilhoso caminho aberto por estes pioneiros morais de uma sociedade por vir que são os portadores de doenças genéticas e raras? Fazendo o dever de casa! E nós, na qualidade de modestos professores, com pretensão desabrida, aqui apontamos os exercícios “para casa”.

Pausa para tomar uma água e fazer o “dever de casa”

Infelizmente, dado o desejo que todos leiam este post, não podemos nos alongar aqui sobre o assunto. Faremos isso em futuro breve. Mas diriamos que nosso “dever de casa”, tarefa a ser realizada por economistas da saúde, órgãos reguladores, governos, pacientes, indústria farmacêutica e sociedade em geral, é o seguinte:  precisamos enfrentar o desafio de desenvolver e avaliar evidências da efetividade (eficácia em condições reais de uso) destas terapias e seu real valor. Uma atenção redobrada deverá ser dada ao desenvolvimento de mecanismos de precificação e pagamento, incluídas aí novas e criativas abordagens de pagamento, baseada na amortização de longo prazo (em suaves prestações, no português claro) dos custos iniciais das mesmas.

Desconhecem-se também os problemas de segurança destas terapias no longo prazo. Caminhos adaptativos e registros eletrônicos de pacientes serão fundamentais para ir trocando os pneus deste carro, quando a segurança ratear, com o mesmo ainda andando. Não há tempo a perder.

E o engenho humano que já nos levou à Lua e desenvolveu estas magníficas promessas terapêuticas não haverá de nos faltar nesta hora. Mas é fundamental a união de todos nesta tarefa. Indústria, órgãos reguladores, pacientes e sociedade civil organizada precisarão sentar para conversar sem cartas na manga, em modalidades de diálogo deliberativo ainda não vistas ou conhecidas do lado debaixo do equador. Sem união, a bomba-relógio que cada um destes pacientes carrega em seu peito continuará o seu sinistro e devastador tiquetaque até a catástrofe final. É necessário desarmá-la o quanto antes, através da concórdia e da busca de interesses comuns.

Tudo indica que as convencionais avaliações de tecnologias em saúde (ATS), já insuficientes e inadequadas para a análise de doenças ultrarraras (como aqui neste blog várias vezes afirmado), se revelarão obsoletas para avaliar o real valor de terapias gênicas.  O problema já começa a se observar e tem sido denunciado por alguns visionários do campo da economia da saúde. Contamos com o talento das cabeças coroadas da Farmacoeconomia para desenvolver métodos que promovam a justiça no campo do acesso a estas terapias.

Em nossa breve prática de arvorismo científico aqui ensaiada neste post, subimos numa plataforma que, erguendo-se acima da copa de uma frondosa árvore, nos permitiu contemplar brevemente a grandeza da floresta que está diante de nós. Não percamos esta oportunidade! Não é todo dia que desviamos o olhar de um jequitibá para contemplar toda a floresta ! Voltaremos para um passeio pela floresta, com a ajuda do nosso arvorismo científico, em breve! Reservem seus lugares!

 

1 comentário em “A árvore e a floresta: Spinraza e o futuro da terapia gênica”

  1. Olá com todo meu carinho e respeito peço à atenção …..😻 😘 ❤️ 🦋 Boooaaaa…..Noite 😴 🌙Tarde 😻🦋 🤩 Dia ☕️🍪☕️🍰Miasqueridas Amigas/os ❤️ Meninas/os🤩😻 ❤️💝 a todas as pessoas… 🌟🙏🏾❤️ em nome do nosso “menino / Rei 🤴🏻 Arthur” meu neto corujice de vó 👵🏽 e de todos os outros anjos 😇meninas👧🏻👧🏼meninos👦🏻👦🏼rapazinhos e moças👱🏼‍♀️👱🏾‍♀️etc…que sofrem da “Atrofia Muscular Espinhal ” do meu amadoneto é n. 1 ( tem a 2 e 3) ” AME ” venho encarecidamente pedir a vocês com muito carinho e respeito 🙏🏾🌟🙏🏾 para publicar ou curtir 👏🏾👏🏾👏🏾 fazendo este ato por uma causa tão nobre e justa 😻😽 é muito “URGENTE” pois o remédio “SPINRAZA” depende de MUITAS…VIDAS 🌟❤️ e “AME ” 💖 ❤️ deixem no Facebook a sua curtida ou seu compartilhamento a este abaixo assinado, vocês 🌟🙏🏾❤️estarão ajudando a colher assinaturas para que o “GOVERNO” ajudem na liberação de verba para compra🌟🙏🏾👏🏾👣👣… do medicamento “SPINRAZA” pelo ” SUS ” pois é de alto custo financeiro para todas as famílias que não podem arcar com o tratamento de tal grande gravidade de vidas destes anjos e anjas❤️🌟❤️🌟gradeçemos imensamente o gesto carinhoso e amor ❤️ respeito a cada um de vocês👑🤴🏻🙏🏾🙏🏾🙏🏾🌟🌟🌟mais uma vez muitooooo…obrigada! “SUS ” se deixe ser amado pela “AME ” abraçossss….🤗 a todos de uma vó 👵🏽 Marinea Pereira PIMENTEL 💖 esperançosa 🙏🏾🌟por esta imensa conquista peço a DEUS desta VITÓRIA do “SUS ” 🙏🏾🌟👏🏾 agradeçemos a todos ❤️ imensamente a atenção e carinho de todo o nosso 💖 ❤🌟🙏🏾 Todos nós estamos que o ” SUS ” “AME ” fiquem de mãos dadas eternamente 💖 ❤️ com o ” SPINRAZA ” ❤️😘😍👣👣…ESPÍRITO SANTO 🌟🙏🏾❤️VITÓRIA 🌟🙏🏾 BRASIL 🇧🇷 🇧🇷🇧🇷🌟😘🦋😻😽❤️👣👣…

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