Cláudio Cordovil

Estudo revela que novos oncológicos têm benefícios adicionais discutíveis

Um novo estudo conduzido por pesquisadores da Universidade de Utrecht lança luz sobre a dinâmica do benefício adicional e o faturamento de medicamentos oncológicos aprovados pela Agência Européia de Medicamentos (EMA) entre 1995 e 2020. As descobertas, publicadas recentemente no The British Medical Journal, revelam achados importantes. Eles nos interessam porque fala-se muito em cânceres raros atualmente e porque os medicamentos órfãos destinados a tratar doenças raras podem enfrentar o mesmo problema.

Muitos novos medicamentos oncológicos aprovados na UE não apresentam evidência de benefício adicional

O estudo teve como objetivo avaliar o benefício adicional e os resultados financeiros de medicamentos oncológicos, explorando diferentes vias de aprovação da Agência Européia de Medicamentos. Usando dados de várias organizações e relatórios financeiros publicamente disponíveis, os pesquisadores identificaram 458 avaliações de benefício adicional para 131 medicamentos oncológicos e dados de receita para 109 medicamentos oncológicos.

Medicamentos com aprovação acelerada (fast track)

Os pesquisadores descobriram que muitos desses medicamentos carecem de prova de benefício adicional em comparação ao medicamento já em uso. De fato, 41% das 458 avaliações de benefício adicional foram negativas, indicando que nenhum benefício adicional foi (ou poderia ser) determinado. Isso pareceu particularmente verdadeiro para medicamentos que foram aprovados por meio de regulamentações especiais chamadas “vias de aprovação acelerada” (fast track).

O fast track é um sistema de regulamentações que facilita uma entrada mais rápida no mercado para medicamentos destinados a pacientes com uma necessidade médica não atendida. Para tanto, menos evidências são exigidas no momento da aprovação do medicamento, desde que estudos adicionais posteriores sejam realizados para reunir evidências adicionais de eficácia e segurança. Essa evidência limitada inicial poderia explicar por que o benefício adicional não pode ser estabelecido.

A aprovação acelerada (fast track) pode ser uma maneira de fazer com que os pacientes se beneficiem de um novo medicamento, mas questiona-se se o benefício adicional por ele oferecido pode posteriormente ser provado

Mesmo medicamentos sem ou com benefício adicional limitado recuperam em três anos os custos de P&D.
Isso derruba a tese de que estes medicamentos possuem preços elevadíssimos para se recuperar seu custo de produção

Farmacoepidemiologia e Farmacologia Clínica

Os autores enfatizam que aprovar medicamentos por essas chamadas vias de aprovação acelerada não é necessariamente algo ruim. “Há frequentemente uma grande necessidade de novos medicamentos”, diz Lourens Bloem, um dos pesquisadores que contribuíram para este estudo. “Isso é especialmente verdade em oncologia, onde a necessidade médica é frequentemente alta. A aprovação acelerada pode ser uma maneira de fazer com que os pacientes se beneficiem de um novo medicamento, mas questionamos se o benefício adicional pode eventualmente ser provado, uma vez que dados adicionais estejam disponíveis. Portanto, é essencial continuar monitorando o benefício adicional real desses tipos de medicamentos e avaliar os custos envolvidos.”

Muitos medicamentos contra o câncer recentemente aprovados pela Agência Europeia de Medicamentos (EMA) não possuem uma prova clara de benefício adicional em relação ao congênere já em uso. Isso é particularmente verdadeiro para medicamentos que são concedidos por processos especiais, destinados a acelerar a aprovação de tratamentos promissores. Uma equipe de pesquisa da Universidade de Utrecht chegou a essa conclusão no periódico científico The British Medical Journal. Seu estudo também indica que quase todos os medicamentos oncológicos, incluindo esses medicamentos que foram aprovados de modo acelerado, conseguem recuperar seus substanciais custos de pesquisa e desenvolvimento (P&D) relativamente rápido após a aprovação.

Recuperando os custos de P&D

O estudo revela que mais da metade dos medicamentos oncológicos, incluindo aqueles com benefício adicional mínimo ou nenhum, conseguem recuperar seus custos de pesquisa e desenvolvimento (P&D) dentro de três anos. De acordo com os pesquisadores, isso derruba a alegação da indústria farmacêutica de que os preços elevados dos medicamentos são necessários para compensar as despesas de P&D.

Embora níveis menores de benefício adicional possam resultar em receitas menores, estas ainda são suficientemente altas para recuperar as despesas de P&D.

Para entender o caso:

Estaríamos trocando seis por meia dúzia? E pagando os olhos da cara por isso?

Imagine que você está considerando trocar seu carro por um modelo mais novo, que promete ser mais eficiente, seguro e com tecnologia superior.

Você faz o investimento esperando que este novo carro lhe ofereça uma experiência de condução significativamente melhorada em relação ao seu veículo atual. No entanto, após a compra, você percebe que as melhorias são mínimas e que o desempenho é praticamente o mesmo do seu carro antigo.

No mundo dos medicamentos, especialmente os voltados para o tratamento do câncer, uma situação parecida está acontecendo.

Quando cientistas desenvolvem um novo medicamento para o câncer, eles afirmam que esse medicamento é especial porque pode ajudar as pessoas de uma maneira nova ou melhor do que os medicamentos antigos. Isso é chamado de “valor adicional”, ou seja, algo a mais que o novo medicamento traz e que os anteriores não têm.

Mas, um estudo realizado por pesquisadores da Universidade de Utrecht descobriu que muitos desses novos medicamentos, que deveriam ser especiais, na verdade, não mostram claramente se são melhores do que os medicamentos que já existem. Mesmo assim, esses medicamentos novos começam a ser vendidos e as empresas que os fabricam conseguem ganhar bastante dinheiro com eles rapidamente, mesmo sem provar que são realmente superiores.

Os pesquisadores analisaram muitos medicamentos para o câncer aprovados entre 1995 e 2020 e observaram que, em muitos casos, não era possível afirmar se o medicamento novo oferecia um benefício extra. Eles também notaram que, mesmo os medicamentos que não provaram ser superiores, ainda assim fazem bastante sucesso e geram muito dinheiro.

Isso é importante porque os medicamentos para câncer podem ser muito caros, e se estamos pagando mais por algo novo, queremos ter certeza de que é realmente melhor do que o que já temos. Os pesquisadores estão dizendo que precisamos prestar mais atenção para garantir que os medicamentos novos realmente ajudam as pessoas mais do que os antigos e que o dinheiro está sendo investido da melhor maneira possível.

Receitas Aceitáveis

A análise mostra que medicamentos com níveis mais altos de benefício adicional geralmente levam a maiores receitas. “Embora níveis menores de benefício adicional possam resultar em receitas menores, estas ainda são suficientemente altas para recuperar as despesas de P&D”, escreve a equipe de pesquisa no BMJ. Isso pode diminuir o incentivo da indústria farmacêutica para desenvolver medicamentos de alto valor, argumentam os pesquisadores, “pois as empresas farmacêuticas podem ficar satisfeitas com a receita gerada por medicamentos de valor mais baixo”.

Processos de Reembolso

Uma vez que se espera que os gastos globais com medicamentos oncológicos aumentem significativamente nos próximos anos, os autores argumentam que os processos regulatórios e de reembolso devem ser melhor alinhados. Isso poderia ajudar a estimular as empresas farmacêuticas a continuar buscando medicamentos que ofereçam benefícios adicionais significativos, e não se contentar com medicamentos que ofereçam benefícios mínimos adicionais, mas ainda gerem uma receita aceitável.

“Convocamos os gestores a reavaliarem consistentemente tanto as iniciativas em andamento quanto as novas, visando garantir um acesso justo, acessível e sustentável do paciente a medicamentos inovadores e caros”, escrevem os autores em um artigo de opinião, também publicado no BMJ. “Além disso, enfatizamos a importância de investigar e promover o uso racional desses medicamentos na prática clínica. Essa abordagem visa um futuro onde o desenvolvimento de medicamentos e os recursos limitados estejam mais alinhados com os benefícios reais para os pacientes.”

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