O acesso às terapias genéticas para doenças raras é um desafio complexo que demanda superação de barreiras significativas. A falta de infraestrutura adequada, modelos de financiamento inovadores e incerteza dos resultados são alguns dos obstáculos a serem enfrentados. No entanto, é fundamental unir esforços e promover ações conjuntas entre diferentes setores para garantir que os sistemas de saúde estejam preparados para oferecer tratamentos acessíveis e de qualidade.
Pensando nisso, destaquei e resumi para vocês relatório que é derivado de encontro ocorrido no World Health Summit, em Berlim, em outubro do ano passado. Ele revela os desafios complexos que devem enfrentar os países que pretendem alcançar o ápice da revolução biotecnológica.
Qualquer ONG ou liderança que imagine que os governos só não implementam com mais celeridade ações para dispormos de maior variedade de terapias genéticas estará vendo a árvore e esquecendo a floresta.
Este material vem ao encontro de estudo que divulgamos aqui e que estou desenvolvendo com um grupo de pesquisadores nacionais e estrangeiros sobre inovação social farmacêutica.
O que você vai ler aqui!
- O Framework que resumimos abaixo concentra-se em algumas barreiras e oportunidades selecionadas discutidas durante a referida mesa-redonda, que têm um impacto significativo na preparação para a era da terapia genética de doenças raras.
- O objetivo deste Framework é servir como ponto de partida para discussões sobre as barreiras e oportunidades relacionadas à entrega e acesso à terapia genética.
- Para superar as complexas barreiras do sistema de saúde, os países podem implementar as oportunidades potenciais oferecidas neste Framework, adaptando-as ao nível de seu status quo e prioridades do sistema de saúde de cada país.
- Os pacientes são os principais beneficiários desses esforços e devem ser incluídos como co-líderes e co-criadores das soluções.
Introdução
No mês de outubro de 2022, durante o World Health Summit em Berlim, a Alliance for Regenerative Medicine e a Pfizer organizaram uma mesa-redonda que reuniu representantes de diferentes setores com o objetivo de discutir como os países poderiam facilitar o acesso a terapias genéticas.
Os participantes reconheceram a necessidade de estratégias adaptadas às diferenças entre países de alta renda e países de renda média e baixa.
Como resultado dessa discussão, foi produzido o relatório intitulado “Framework para Fortalecer os Sistemas de Saúde para Terapia Genética de Doenças Genéticas Raras”.
Esse relatório contém recomendações aos gestores de sistemas de saúde e autoridades governamentais, visando facilitar a entrega e o acesso a futuras terapias genéticas aprovadas.
O relatório identifica barreiras e oportunidades nos sistemas de saúde em duas áreas principais: prestação de cuidados e acesso do paciente.
As barreiras são obstáculos e desafios que dificultam a prestação de cuidados e o acesso à terapia genética, enquanto as oportunidades do sistema de saúde são políticas públicas, regulamentações e iniciativas que podem facilitar essa prestação de cuidados e acesso.
O relatório concentra-se em algumas barreiras e oportunidades específicas discutidas durante a mesa-redonda, que têm um impacto significativo na preparação para a terapia genética de doenças raras.
Esse framework serve como ponto de partida para discussões sobre as questões relacionadas à entrega e ao acesso às terapias genéticas.
Barreira 1: Infraestrutura para diagnóstico e determinação da elegibilidade do paciente
A falta de infraestrutura para diagnóstico e determinação da elegibilidade do paciente é apontada como uma barreira significativa.
O diagnóstico de doenças raras é complexo e muitas vezes demorado, resultando em atrasos nos cuidados e diagnósticos incorretos.
A triagem neonatal é destacada como uma estratégia eficiente, mas sua implementação requer maior investimento em infraestrutura e pessoal treinado.
Além disso, a determinação da elegibilidade do paciente para terapia genética exige diretrizes clínicas claras e profissionais especializados.
A educação dos pacientes e suas famílias sobre terapia genética também é destacada como um desafio, e é enfatizada a importância de programas de educação abrangentes e baseados em evidências para todas as partes interessadas.
Oportunidades:
Apoiar a Educação Multissetorial:
- Treinamento abrangente da equipe clínica sobre terapia genética.
- Comunicação educacional para pacientes, cuidadores e formuladores de políticas.
Fortalecer a Infraestrutura para Triagem Neonatal (NBS):
- Implementar programa nacional de triagem neonatal.
- Monitorar ensaios clínicos de terapia genética e celular para inclusão na triagem neonatal.
Desenvolver um Framework de Governança para Elegibilidade e Encaminhamentos:
- Estabelecer framework nacional de governança de dados de saúde.
- Criar consórcio multissetorial para coordenar cuidados de pacientes elegíveis.
Barreira 2: Falta de infraestrutura para entrega de terapia genética
Os pacientes enfrentam barreiras complexas ao acessar a terapia genética devido à falta de infraestrutura adequada.
A terapia genética é altamente especializada e requer uma equipe multidisciplinar, expertise e capacidades técnicas.
A variabilidade regulatória global também dificulta a compreensão dos requisitos regulatórios em cada país.
Para doenças raras, existem clínicas e centros especializados, mas condições ultrarraras têm menos recursos, e centros de excelência abrangendo várias doenças são necessários.
O modelo de cuidado de hub-and-spoke, onde os centros de excelência se conectam a instalações menores, pode ser eficaz.
A falta de infraestrutura de fabricação, administração e entrega de cuidados é uma barreira crítica para o acesso à terapia genética.
Oportunidades:
Certificar Centros Nacionais de Excelência (COEs):
- Estabelecer processos de avaliação independente para certificar centros de excelência.
- Criar COEs endossados nacionalmente para facilitar diagnóstico, elegibilidade e cuidados.
Integrar o Modelo Hub-and-Spoke:
- Implementar um piloto do modelo hub-and-spoke, conectando COEs a instalações menores.
- Incluir formalmente as instalações comunitárias no processo de cuidado através do modelo hub-and-spoke.
Conectar Centros de Excelência (COEs) entre Países:
- Facilitar e encorajar a participação de COEs em redes internacionais.
- Estabelecer redes de especialistas em doenças raras para promover colaboração global.
Barreira 3: Desafios em torno da adequada abordagem de valor para terapias genéticas
A incerteza dos resultados, o impacto financeiro nos sistemas de saúde e a dificuldade das metodologias tradicionais de avaliação são pontos que merecem atenção.
Os benefícios mais amplos das terapias genéticas para doenças raras podem ser subestimados, incluindo a redução de gastos a longo prazo e o valor da esperança para os pacientes.
É necessário aprimorar os métodos de abordagem de valor para aproveitar todo o potencial das terapias genéticas e garantir o acesso dos pacientes.
Esforços estão sendo feitos para incorporar esses elementos de valor nas avaliações, e esperam-se melhorias contínuas à medida que mais terapias genéticas passem por revisão.
Oportunidades:
Engajamento em Diálogo Precoce:
- Desenvolver um processo formal de diálogo entre pagadores, órgãos de avaliação de tecnologia em saúde (ATS) e fabricantes para alinhar critérios de avaliação, necessidades de dados do mundo real e pacotes de evidências.
- Rever as metodologias de avaliação de valor para incorporar evidências do mundo real e critérios transparentes.
Revisão das Metodologias de Avaliação de Valor:
- Gerar evidências robustas do mundo real após o lançamento das terapias genéticas para reduzir incertezas.
- Incluir benefícios a longo prazo das terapias genéticas para doenças raras nas avaliações de valor.
Acesso à Terapia Genética:
- Considerar a perspectiva de vida inteira e taxas de desconto apropriadas nas análises orçamentárias.
- Incorporar elementos adicionais de valor para pacientes, famílias e sistemas de saúde nas decisões de avaliação de valor.
- Desenvolver métodos de comparação indireta.
Apoio a Modelos Multistakeholder de Desenvolvimento de Produtos Medicinais Avançados (ATMP):
- Promover a colaboração entre diferentes stakeholders para desenvolver ATMPs de forma sustentável e acessível.
- Oferecer suporte regulatório a desenvolvedores acadêmicos de ATMPs.
Barreira 4: Desafios para a adoção de modelos financeiros inovadores
A quarta barreira aborda os desafios enfrentados na adoção de modelos de financiamento inovadores para terapias genéticas.
Essas terapias são únicas, pois geralmente são administradas apenas uma vez, o que requer abordagens financeiras diferentes.
No entanto, o alto custo inicial e a incerteza clínica dificultam que os sistemas de saúde realizem pagamentos imediatos.
Para lidar com isso, são necessários modelos de pagamento que diluam os custos ao longo do tempo e estejam vinculados aos resultados obtidos na vida real.
A implementação desses modelos é complexa e exige atualizações nas regulamentações e marcos legais, além de infraestrutura adequada para monitorar a segurança e os resultados a longo prazo das terapias.
Além disso, é crucial ter dados precisos para avaliar o impacto financeiro dessas terapias nos orçamentos de saúde.
Alguns modelos de financiamento inovadores já estão sendo utilizados em algumas regiões, como Estados Unidos e Europa.
Oportunidades:
Apoio à Antecipação e Educação:
- Engajar-se em diálogos precoces com formuladores de políticas e pagadores para educá-los sobre as novas tecnologias e o valor potencial das terapias genéticas.
- Fornecer educação independente e baseada em ciência para formuladores de políticas federais, visando aumentar o entendimento sobre essas terapias.
Apoio ao Uso de Modelos de Pagamento Inovadores:
- Atualizar as leis e regulamentações para acomodar acordos de pagamento baseados em valor e outros modelos inovadores.
- Realizar pilotos de acordos baseados em resultados para terapias genéticas e aprender com essas experiências.
- Implementar esquemas de financiamento que reduzam os custos iniciais e desenvolver infraestrutura de dados para medir resultados do mundo real.
- Compartilhar melhores práticas de financiamento inovador entre os sistemas de saúde.
Conclusão
As terapias genéticas representam uma esperança real para milhões de pessoas que sofrem com doenças genéticas raras e devastadoras.
Essas inovações podem transformar vidas, oferecendo tratamentos eficazes para condições que antes não tinham opções viáveis.
Além disso, essas terapias têm o potencial de revolucionar os sistemas de saúde, repensando o valor da inovação científica e trabalhando rumo a uma cobertura de saúde universal e igualitária.
É hora de unir esforços entre diferentes setores, governos e fronteiras para garantir que os sistemas de saúde estejam preparados para aproveitar todo o potencial dessas terapias genéticas, beneficiando os pacientes de forma sustentável.
Ao superar as barreiras existentes, como a falta de infraestrutura adequada e modelos de reembolso inovadores, poderemos facilitar o acesso e a prestação de cuidados em terapias genéticas.
É fundamental coletar e utilizar evidências do mundo real para avaliar a eficácia desses tratamentos e melhorar continuamente o cuidado e o acesso.
Os países devem implementar essas oportunidades de acordo com sua realidade e prioridades, colocando os pacientes como co-líderes desse processo.
O objetivo final é proporcionar uma nova esperança e qualidade de vida para aqueles que mais precisam.
Queremos ouvir você!
Você acredita que o governo brasileiro está se empenhando adequadamente para ingressar na era das terapias genéticas?
Compartilhe sua opinião e participe da discussão sobre o acesso e a entrega dessas terapias no Brasil.
Juntos, podemos promover avanços e garantir que os pacientes tenham acesso às soluções necessárias.
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