O que você vai ler a seguir:
- Como a Lei nº 15.120/2025 e o Decreto nº 12.716/2025 criam, na prática, uma cadeira com voz e voto para OSCs nos Comitês da Conitec.
- Por que a portaria ainda pendente é a peça-chave: é ela que definirá quem pode sentar nessa cadeira e em quais condições.
- Os riscos de captura regulatória, judicialização e insegurança jurídica surgem se a escolha das OSCs não seguir critérios claros e transparentes.
- As propostas já defendidas pelo blog, que incluem chamadas públicas, rodízio, listas tríplices, pontuação técnica e mediação pelo CNS, visam tornar a participação social legítima e auditável.
- O blog se compromete a continuar monitorando o tema, exigindo uma portaria robusta que fortaleça o controle social e evite que o novo assento se torne apenas um gesto simbólico.
A ampliação da participação social na Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) deu um passo decisivo com a publicação, em 12 de novembro, do Decreto nº 12.716/2025. O texto altera o Decreto nº 7.646/2011, que organiza a Conitec e o processo administrativo de incorporação, exclusão e alteração de tecnologias em saúde no SUS, e adiciona de forma explícita as organizações da sociedade civil (OSCs) como membros dos Comitês, com direito a voz e voto.
O decreto regulamenta a Lei no 15.120, de 7 de abril de 2025. Ela modificou o artigo 19-Q da Lei Orgânica da Saúde (Lei no 8.080/1990) para incluir um assento rotativo destinado a uma organização da sociedade civil constituída há mais de dois anos e atuante na condição de saúde sob análise. A lei também determinou que a Conitec adequasse seu regimento interno para definir critérios de desempate e requisitos para indicação dessa representação em até 180 dias.
Na prática, o Decreto nº 12.716/2025 atualiza a composição dos Comitês da Conitec, que passam de 15 para 17 membros com direito a voto. Ele incorpora, entre outros ajustes, a Secretaria de Informação e Saúde Digital e oficializa a cadeira para uma OSC atuante na especialidade ou patologia em pauta. O decreto também fixa quórum mínimo de nove membros, explicita a realização de reuniões ordinárias mensais e extraordinárias sob convocação da presidência e formaliza o modelo híbrido de participação (presencial ou por videoconferência, conforme a localização do membro).
Apesar desse avanço normativo, um ponto central segue em aberto: os critérios concretos que definirão quais OSCs poderão, de fato, ocupar a cadeira rotativa em cada processo. O próprio texto divulgado pela Conitec informa que “maiores informações e critérios para participação serão detalhados em portaria, a ser publicada nos próximos dias”. Ou seja, o desenho real da participação social – quem entra, como entra e em que condições – continua pendente e concentrado na futura norma infralegal.
Este blog já havia se debruçado sobre o tema logo após a sanção da Lei nº 15.120/2025, em abril, em análise que discutiu avanços e dilemas da nova composição da Conitec. Na ocasião, o texto chamou atenção para o risco de captura regulatória por entidades com baixa representatividade ou fortemente vinculadas à indústria farmacêutica. Além disso, destacou a possibilidade de judicialização em contextos de disputa entre múltiplas OSCs e a insegurança jurídica decorrente da ausência de critérios objetivos de seleção.
Outra análise publicada no blog também problematizara o contexto político que levou à aprovação da lei, incluindo a centralidade das doenças raras na plataforma da autora do projeto de lei e a articulação intensa entre atores do advocacy e o Parlamento. O alerta não era contra a participação de pacientes e organizações, mas contra a possibilidade de que um instrumento concebido para fortalecer o controle social fosse desvirtuado por arranjos pouco republicanos. Isso ocorreria em casos em que associações de fachada ou excessivamente dependentes da indústria passassem a falar em nome de “toda” a sociedade civil.
Naquele comentário, o blog também apresentou – com apoio de experimentos em ferramentas de inteligência artificial – cinco modelos regulatórios possíveis para a ocupação da cadeira das OSCs na Conitec. São eles: chamada pública com sorteio em caso de empate; cadastro nacional com rodízio por critérios objetivos; indicação por redes ou colegiados de OSCs; sistema de pontuação técnica (“meritocracia regulatória”); e lista tríplice elaborada pelo Conselho Nacional de Saúde. Cada modelo foi analisado quanto a vantagens e riscos em termos de legitimidade, transparência, agilidade e mitigação de conflitos de interesse.
Diante da publicação do Decreto nº 12.716/2025, essas propostas ganham renovada atualidade. A portaria que está por vir terá a árdua tarefa de transformar a previsão genérica de um assento rotativo em um mecanismo concreto, testável e auditável de participação social. Se optar por um desenho excessivamente burocrático, corre o risco de afastar justamente as organizações menores, de base e com atuação territorial relevante, que muitas vezes representam populações em maior vulnerabilidade. Se, ao contrário, apostar em critérios frouxos, abre-se a porta para disputas predatórias, instrumentalização das OSCs por interesses privados e contestações judiciais em série.
É nesse ponto que as sugestões anteriormente apresentadas por este blog voltam à cena como agenda propositiva. A portaria deveria combinar transparência radical (chamadas públicas amplamente divulgadas, publicação de notas técnicas de seleção, divulgação de currículos e declarações de conflito de interesse dos representantes) com critérios objetivos mínimos. Esses critérios incluem tempo de existência da organização, lastro de atuação comprovada na condição de saúde em análise, governança interna minimamente estruturada e compromisso com princípios do SUS. Sempre que possível, mecanismos de rodízio e listas tríplices mediadas por instâncias como o Conselho Nacional de Saúde podem contribuir para diluir pressões concentradas.
Outro ponto que merece atenção da portaria é a articulação entre expertise técnica e experiência vivida. A atual regulamentação da Conitec já estabelece requisitos de qualificação técnica para membros dos Comitês na área de Avaliação de Tecnologias em Saúde (ATS). A questão que se coloca é: exigir ou não o mesmo padrão de formação acadêmica do representante da OSC? A resposta não é trivial. Por um lado, seria desejável manter um patamar técnico mínimo; por outro, impor filtros acadêmicos rígidos pode excluir representantes com vasta experiência comunitária e de advocacy, mas sem títulos formais. A portaria terá de encontrar um equilíbrio honesto entre conhecimento técnico e saber experiencial.
Enquanto a portaria não é publicada, o cenário é de transição. A lei existe, o decreto que a regulamenta está em vigor e a cadeira das OSCs foi oficialmente criada nos Comitês da Conitec. Mas o modo como essa participação se materializará ainda é um campo de disputa normativa e política. Cabe à sociedade civil organizada, aos pesquisadores e aos gestores atentos pressionar para que a futura portaria não seja apenas um ato burocrático de cumprimento de prazo, e sim um instrumento robusto de democratização da ATS no Brasil. Este blog, que vem acompanhando o tema desde a tramitação da lei, reforça suas propostas e seguirá monitorando de perto os próximos passos.
Nota de Transparência: Este post foi inicialmente gerado com o auxílio de tecnologias avançadas de Inteligência Artificial (IA), visando otimizar o processo de pesquisa e escrita. No entanto, é importante destacar que todo o conteúdo foi rigorosamente revisado e editado pelo autor deste blog. Nosso compromisso com a precisão e a qualidade da informação permanece inabalável, e a supervisão humana qualificada é uma parte essencial desse processo. A utilização da IA é parte do nosso esforço contínuo para trazer informações atualizadas e relevantes, sempre alinhadas com os mais altos padrões éticos e científicos.
Crédito da foto: O calcanhar de Aquiles, de Rubens


