Cláudio Cordovil

Audiência pública discute desafios na genética clínica do SUS

O Brasil deve investir mais na triagem das mutações para doenças recessivas em casais em idade reprodutiva, visando prevenir o nascimento de novos afetados por doenças não tratáveis ou de custo milionário, como a atrofia muscular espinhal (AME), hemofilia e anemia falciforme. Esse foi um dos consensos da audiência pública da Subcomissão de Direitos das Pessoas com Doenças Raras (CASRARAS) — subcomissão da Comissão de Assuntos Sociais —, realizada nesta terça-feira (14).

Na abertura do evento, a Senadora Mara Gabrilli destacou a importância da discussão sobre a Política Nacional de Atenção Integral em Genética Clínica. Ela enfatizou a relevância do tema para a saúde pública e para pessoas com doenças raras. A Senadora salientou a necessidade de avaliar e aprimorar as medidas existentes relacionadas à política de genética clínica, destacando o papel essencial da audiência pública nesse processo.

A Senadora Gabrilli ressaltou que a audiência fazia parte do plano de trabalho de 2023, focado em aprimorar o acesso ao diagnóstico de doenças raras, enfatizando a relevância da genética clínica nesse contexto.

Em sua fala, a Senadora destacou o objetivo de melhorar a saúde pública e a justiça social, enfatizando a necessidade de políticas efetivas para o diagnóstico e tratamento de doenças raras, além de promover a conscientização e o conhecimento sobre o tema.

Aqui no blog, trazemos um resumo detalhado das contribuições de cada um dos participantes, iluminando as perspectivas de diversos campos da genética e saúde pública.

Mayana Zatz

Durante a reunião, Mayana Zatz, professora de genética do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo, abordou vários aspectos importantes relacionados à genética clínica e doenças raras:

História do Centro de Genoma Humano: Zatz detalhou a missão do centro, que inclui pesquisa científica, transferência de tecnologia, educação e divulgação. Ela mencionou o estudo de mais de 100.000 famílias com doenças genéticas.
Interseção de Genética e Saúde: Ela discutiu como a genética não é apenas sobre doenças hereditárias, mas também sobre condições complexas como Alzheimer, diabetes, câncer e resposta ao coronavírus, destacando a relevância da genética em várias áreas da saúde.
Projeto Genoma Humano e Avanços Tecnológicos: Zatz falou sobre o Projeto Genoma Humano e os avanços na tecnologia de sequenciamento genético, que melhoraram o diagnóstico de doenças genéticas.
Estudo da População Brasileira e Diversidade Genética: Ela destacou a importância de estudar a população brasileira, mencionando a descoberta de variantes genéticas únicas não presentes em bancos de dados internacionais, refletindo a diversidade genética do Brasil.
Implicações de Variantes Genéticas na Saúde: Zatz citou exemplos de como variantes genéticas podem ter implicações diferentes em populações distintas, como no caso da mutação BRCA1 em uma senhora saudável de 93 anos.
Triagem Neonatal e Testes Genéticos: Ela abordou a importância dos testes genéticos, especialmente a triagem neonatal para doenças tratáveis, discutindo também questões éticas em testes preditivos para doenças de início tardio.
Pesquisa em Autismo: Foi mencionado o trabalho do centro em relação ao espectro autista, destacando a heterogeneidade genética e a necessidade de mais pesquisas.
Terapia Gênica e Questões Éticas: Zatz discutiu as aplicações e desafios éticos da terapia gênica, enfatizando a necessidade de tornar os tratamentos acessíveis.
Prevenção de Doenças Genéticas e Propostas de Triagem: A ideia de prevenir o nascimento de indivíduos afetados por doenças genéticas através de triagem de mutações foi apresentada como uma proposta ao Ministério da Saúde.

A fala de Mayana Zatz foi abrangente, cobrindo desde os aspectos técnicos e científicos da genética até as implicações sociais e éticas, destacando a importância da genética na saúde pública e na pesquisa.

Vanessa Luiza Romanelli Tavares

Na fala de Vanessa Luiza Romanelli Tavares, supervisora do laboratório de biologia molecular do Instituto Jo Clemente, ela abordou diversos aspectos importantes relacionados à genética clínica e doenças raras:

Pioneirismo e Atuação do Instituto Júlio César Clemente: Tavares destacou o pioneirismo e a amplitude das atividades do instituto, que incluem prevenção, promoção da saúde e triagem neonatal, além de estratégias de inclusão social e educação em relação a doenças raras.
Triagem Neonatal: Ela ressaltou a importância da triagem neonatal, que é um dos eixos estratégicos do instituto. Tavares explicou que a triagem não se limita apenas ao diagnóstico, mas abrange um programa de cuidado integral, desde a coleta da amostra até o tratamento e acompanhamento dos pacientes.
Desafios na Rotina Diagnóstica: Tavares mencionou desafios enfrentados na prática clínica, como a dificuldade de interpretação de testes genéticos por profissionais clínicos e a necessidade de educação continuada para profissionais de saúde.
Capacitação Continuada e Educação: Ela enfatizou a necessidade de programas de capacitação para profissionais da saúde, citando exemplos de programas de sucesso que podem servir como modelo.
Centro Integrado de Doenças Genéticas: Tavares apresentou uma iniciativa recente, o Centro Integrado de Doenças Genéticas, que visa melhorar o diagnóstico, tratamento e reabilitação de pacientes com doenças genéticas, além de promover a pesquisa e o desenvolvimento de políticas públicas.
Importância da Telemedicina: Ela destacou a relevância da telemedicina para atender pacientes com sintomas avançados de doenças genéticas, especialmente aqueles localizados em regiões afastadas dos grandes centros.
Desafios com Casos Sem Conclusão Diagnóstica: Tavares abordou a questão de pacientes que não conseguem um diagnóstico conclusivo devido à falta de acesso a testes genéticos no sistema público de saúde.
Perspectivas Futuras e Parcerias: Ela apontou a necessidade de desenvolvimento de programas de apoio ao paciente com doenças raras, enfatizando a importância de parcerias com a iniciativa privada para negociação de custos de tratamento e desenvolvimento de tecnologias.

Vanessa Tavares proporcionou uma visão abrangente das atividades e desafios relacionados à genética clínica e doenças raras, destacando a importância da educação e capacitação contínua dos profissionais de saúde, bem como a necessidade de maior integração e apoio na área de doenças genéticas.

Andrea Kely Campos Ribeiro dos Santos

Na reunião, Ândrea Kely Campos Ribeiro dos Santos, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Genética, focou sua fala em aspectos cruciais relacionados à genética e saúde pública no Brasil:

Diversidade Genética Brasileira: Ribeiro dos Santos destacou a complexidade e diversidade genética da população brasileira, resultante da miscigenação de diversos grupos étnicos, incluindo indígenas, africanos e europeus. Ela ressaltou que essa diversidade tem implicações significativas para a saúde pública e para o entendimento de doenças genéticas e raras.
Sub-representação de Dados Genômicos: Ela apontou que há uma grande falta de dados genômicos representativos de várias regiões do Brasil, especialmente nas regiões Norte e Nordeste. Essa sub-representação impede um entendimento completo da genética da população brasileira.
Importância do Estudo da Variabilidade Genômica: Ribeiro dos Santos argumentou que investigar a variabilidade genômica é essencial para abordar questões de saúde e promover uma medicina mais personalizada. Ela enfatizou que a compreensão dessa variabilidade é fundamental para identificar alelos raros que podem levar a doenças raras ou a reações adversas a tratamentos.
Pesquisas Genômicas Regionais: Ela citou exemplos de pesquisas realizadas na região Amazônica, demonstrando a descoberta de milhares de novos alelos em populações indígenas, que podem ser cruciais para entender doenças específicas e respostas a tratamentos.
Associação Genética e Saúde na Região Norte: Ribeiro dos Santos mencionou um estudo sobre a COVID-19 na região Norte, identificando variantes genéticas associadas a formas graves da doença. Esse estudo realça a importância de investigar variantes genéticas específicas em populações locais.
Desafios na Saúde Baseada em Genômica: Ela discutiu os desafios de implementar uma saúde baseada em genômica no Brasil, dada a diversidade genética e a falta de dados genômicos nacionais abrangentes.
Necessidade de Cooperação e Diálogo: Ribeiro dos Santos enfatizou a necessidade de um diálogo contínuo entre governos e instituições de ensino e pesquisa para promover uma melhor compreensão e tratamento de doenças genéticas e raras no Brasil.

Ândrea Kely Campos Ribeiro dos Santos sublinhou a complexidade da genética na saúde pública brasileira e a necessidade urgente de ampliar a pesquisa genômica para abarcar toda a diversidade da população brasileira, visando melhorar o diagnóstico e tratamento de doenças genéticas e raras.

Dafne Horovitz

Na reunião, Dafne Horovitz, coordenadora clínica do centro de genética médica e serviço de referência em doenças raras do Instituto Fernandes Figueira (Fiocruz), abordou vários aspectos importantes relacionados à genética clínica e doenças raras:

Histórico da Política Nacional de Atenção Integral à Genética Clínica: Horovitz discutiu a evolução da política nacional de atenção à genética clínica no Brasil, desde a sua concepção até a implementação atual.
Desafios na Implementação da Política: Ela destacou os desafios enfrentados na implementação da política, incluindo a falta de recursos orçamentários e o apoio político limitado, o que dificultou a sua efetivação.
Política Nacional de Atenção às Pessoas com Doenças Raras: Horovitz explicou que a política de doenças raras, estabelecida em 2014, inclui incentivos financeiros para cuidados e tratamento, englobando as doenças genéticas.
Estrutura da Política de Doenças Raras: A política é estruturada em dois eixos principais: doenças raras de origem genética e doenças raras não genéticas. Ela detalhou os grupos de doenças abrangidos por cada eixo.
Financiamento e Remuneração: Horovitz discutiu o financiamento para a política de doenças raras, incluindo a valoração de procedimentos de diagnóstico e a remuneração para serviços de referência.
Serviços de Referência em Doenças Raras: Ela enfatizou a importância dos serviços de referência para o diagnóstico e tratamento de doenças raras, incluindo aconselhamento genético e suporte laboratorial.
Desafios de Acesso e Organização: Horovitz apontou a necessidade de melhorar o acesso e a organização dos serviços de genética clínica, incluindo a distribuição geográfica dos serviços e o suporte aos gestores de saúde.
Necessidade de Ações de Prevenção: Ela salientou a importância de ações de prevenção, incluindo aconselhamento genético e planejamento familiar, e destacou a necessidade de um grupo de trabalho para o acompanhamento contínuo da política de doenças raras.

Dafne Horovitz foi uma contribuição significativa, destacando a evolução, os desafios e as necessidades atuais da política de genética clínica e doenças raras no Brasil, com ênfase na importância de um atendimento integral e acessível para pessoas com doenças raras.

Ida Schwartz

Ida Schwartz – Presidente da Sociedade Brasileira de Genética Médica e Genômica, Schwartz abordou o aconselhamento genético, a testagem genética, a triagem neonatal e a odisseia diagnóstica dos indivíduos com doenças raras, propondo soluções e enfatizando a necessidade de regulamentação da profissão de assessor genético.

Na fala de Ida Schwartz, presidente da Sociedade Brasileira de Genética Médica e Genômica, ela abordou vários tópicos importantes relacionados à genética clínica:
Aconselhamento Genético: Schwartz enfatizou a importância do aconselhamento genético, explicando que ele envolve a compreensão dos aspectos médicos de uma doença genética, a contribuição da hereditariedade, e as opções para lidar com o risco de recorrência. Ela destacou que o aconselhamento genético tem evoluído ao longo dos anos para um modelo mais psicoeducacional.
Testagem Genética: A fala incluiu uma discussão sobre a testagem genética, destacando que seu objetivo é prevenir o desenvolvimento de doenças genéticas e assegurar diagnóstico e tratamento precoces. Schwartz ressaltou a importância de realizar a testagem genética num contexto de saúde e doença, e não apenas como uma ferramenta de pesquisa.
Triagem Neonatal: Ela mencionou a triagem neonatal como uma forma de teste genético, esclarecendo que, embora possa estar indicada para doenças genéticas, também é usada para condições não genéticas.
Odisseia Diagnóstica: Schwartz abordou a questão da “odisseia diagnóstica” enfrentada por pessoas com doenças raras, referindo-se ao longo caminho percorrido desde o início dos sintomas até o diagnóstico. Ela discutiu a necessidade de estratégias educativas tanto para famílias quanto para profissionais de saúde para reconhecer sinais de alerta de doenças raras.
Desafios e Soluções: Schwartz identificou desafios como o número limitado de médicos geneticistas e as longas filas de espera para atendimento em genética. Como soluções, ela sugeriu estratégias como o uso da telemedicina, a formação de equipes multiprofissionais, o uso de tecnologias de saúde e instrumentos educativos.
Regulamentação da Profissão de Assessor Genético: Ela destacou a necessidade de regulamentar a profissão de assessor genético no Brasil, assim como a importância de sua formação através de residência multiprofissional.
Enfatizando a Educação e Acesso: Schwartz reforçou a necessidade de educar tanto as famílias quanto os profissionais de saúde sobre doenças genéticas e raras para melhorar o reconhecimento e o encaminhamento adequado.

Ida Schwartz deu uma contribuição significativa, destacando aspectos práticos e desafios no campo da genética clínica, bem como a importância do aconselhamento genético e a necessidade de melhorar a educação e o acesso aos serviços relacionados.

Natan Monsores

Na fala de Natan Monsores, Técnico da Coordenação Geral de Doenças Raras do Ministério da Saúde, durante a reunião sobre a política de atenção em genética clínica no SUS, alguns pontos principais foram destacados:

Capacitação de Profissionais: Existe um plano para capacitar profissionais, especialmente na atenção básica, para identificar sinais de alerta de condições genéticas. Isso é parte do esforço de fortalecer a atenção básica e facilitar o encaminhamento para serviços especializados.
Oferta de Exames Genéticos: O Ministério da Saúde planeja estruturar a oferta de painéis NGS (Sequenciamento de Nova Geração) e exoma dentro do SUS. Essa ação visa organizar e mediar o processo através de telemedicina e fila única nacional.
Desafios e Soluções para o Aconselhamento Genético: Foi reconhecida a necessidade de melhor organizar e habilitar serviços de genética clínica, incluindo a identificação e a chancela de grupos de genética em hospitais universitários e secundários.
Integração dos Serviços de Genética Clínica no SUS: Há uma necessidade identificada de integrar melhor os serviços de genética clínica, incluindo aqueles voltados para doenças como Down e anomalias congênitas, dentro da estrutura do SUS.
Regulamentação da Profissão de Assessor Genético: A regulamentação da profissão de assessor genético foi apontada como uma necessidade, bem como a importância da formação desses profissionais através de residência multiprofissional.
Monitoramento e Segmento de Cuidado: Discutiu-se a necessidade de melhor monitoramento e segmento de cuidado para pacientes, pós-diagnóstico, e como isso se relaciona com a estrutura do SUS e os hospitais universitários.

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