Cláudio Cordovil

A breve esperança de Pedro: menino de São Carlos recebe terapia de R$ 17 milhões, mas morre três meses depois

Aplicação do Elevidys foi celebrada como um “renascimento”; criança faleceu no início de junho após infecção por influenza. Caso levanta debates sobre judicialização, risco-benefício e farmacovigilância em terapias gênicas.

Pedro Henrique Garcia, de apenas oito anos, tornou-se símbolo da luta de famílias brasileiras por acesso a medicamentos de alto custo. Portador de Distrofia Muscular de Duchenne (DMD), uma doença genética rara, Pedro teve seu nome nacionalmente conhecido ao receber, em março deste ano, a dose do medicamento Elevidys — uma terapia gênica com valor estimado em R$ 17 milhões. O tratamento foi viabilizado por decisão judicial, após intensa mobilização da família e uma reviravolta no Supremo Tribunal Federal (STF), protagonizada pelo ministro Gilmar Mendes.

“Pedro renasceu”, disse emocionado o pai, Leandro Garcia, no dia da aplicação do remédio, realizada no Hospital das Clínicas de Campinas. A autorização veio após um parecer favorável do STF, que suspendeu decisões anteriores que limitavam o acesso ao medicamento, salvo em casos excepcionais como o de Pedro, que estava prestes a completar oito anos.

A DMD é uma condição degenerativa para a qual ainda não há cura. O Elevidys, aprovado emergencialmente pela Anvisa no fim de 2024, é uma terapia gênica que visa retardar o avanço da doença ao inserir uma versão funcional do gene distrofina. A esperança era que a aplicação precoce pudesse preservar a força muscular e aumentar a expectativa e qualidade de vida de Pedro.

Mas a trajetória da criança teve um desfecho trágico. No início de junho, Pedro contraiu o vírus da influenza e foi internado com complicações respiratórias e renais. Após transferência para um hospital em Franca, não resistiu. O falecimento ocorreu no sábado, 7 de junho, menos de três meses após o tratamento.

O caso de Pedro reabre o debate sobre o uso emergencial de terapias gênicas em sistemas públicos de saúde, especialmente em situações de judicialização. Embora o tratamento tenha sido interpretado como um avanço para a família, a curta sobrevida do paciente levanta dúvidas sobre critérios de elegibilidade, preparação das unidades hospitalares e protocolos de acompanhamento pós-aplicação.

Pedro deixa um legado de esperança e alerta. Sua breve jornada entre o “renascimento” e o adeus evidencia a complexidade das decisões que envolvem terapias inovadoras, o poder da mobilização social e os limites da medicina diante de doenças graves. Ao mesmo tempo, expõe a urgência de equilibrar justiça, ciência e humanidade em tempos de biotecnologia acelerada.

Até o fechamento desta matéria, o Ministério da Saúde não havia se pronunciado sobre o caso.

RDC 406/2020: Anvisa estabelece regras rígidas para monitoramento da segurança de medicamentos no Brasil

Publicada em 22 de julho de 2020, a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº 406/2020 da Anvisa institui as Boas Práticas de Farmacovigilância para todos os detentores de registro de medicamentos de uso humano no Brasil. O objetivo central da norma é garantir que fabricantes, importadores e distribuidores monitorem de forma contínua e sistemática os riscos associados aos seus produtos, com foco na segurança do paciente.

A resolução exige que os responsáveis pelos medicamentos implantem um sistema de farmacovigilância robusto, capaz de identificar, avaliar, entender e prevenir eventos adversos ou quaisquer problemas relacionados ao uso de fármacos. Entre as exigências estão:

  • Nomeação de um responsável técnico por farmacovigilância;
  • Manutenção de um Sistema de Gestão da Qualidade aplicado à farmacovigilância;
  • Elaboração de Planos de Gestão de Risco (PGR) e Relatórios Periódicos de Avaliação Benefício-Risco (RPBR);
  • Notificação obrigatória de eventos adversos graves à Anvisa em até 15 dias;
  • Envio de dados por meio do sistema eletrônico VigiMed.

A RDC 406/2020 também fortalece a articulação entre empresas e autoridades sanitárias, permitindo ações regulatórias mais ágeis diante de riscos emergentes. A norma está alinhada com diretrizes internacionais, como as da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da International Council for Harmonisation (ICH).

No caso do medicamento Elevidys, administrado ao menino Pedro Henrique, a Roche, que lidera todos os processos regulatórios, negociações de preço, distribuição e acompanhamento clínico do medicamento em outros mercados, como Europa, América Latina (incluindo o Brasil), Ásia e Oriente Médio, deverá encaminhar à Anvisa todas as informações relacionadas ao óbito e colaborar com a investigação do evento adverso (RDC 406). A resolução exige que todas as etapas sejam documentadas e que haja comunicação transparente com os profissionais de saúde e o público, sempre que necessário.


Com informações do site São Carlos Agora.

Legenda da foto: A mãe Michele, Pedro e o pai, Leandro Garcia – Crédito: arquivo pessoal / Reprodução

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Cláudio Cordovil Pesquisador em Saúde Pública
Jornalista profissional. Servidor Público. Pesquisador em Saúde Pública (ENSP/Fiocruz). Especializado em Doenças Raras, Saúde Pública e Farmacoeconomia . Mestre e Doutor em Comunicação e Cultura (Eco/UFRJ). Prêmio José Reis de Jornalismo Científico concedido pelo CNPq.

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