Cláudio Cordovil

Terapia gênica para Duchenne aprovada pela FDA gera debate sobre eficácia limitada e alto custo

A terapia gênica delandistrogene moxeparvovec, conhecida comercialmente como Elevidys, aprovada pela FDA para distrofia muscular de Duchenne (DMD), enfrenta forte controvérsia científica e regulatória, segundo avaliação detalhada da Academia Americana de Neurologia (AAN). O tratamento, apesar de já liberado nos Estados Unidos, apresentou resultados clínicos inconclusivos e suscitou questões significativas sobre segurança e custo.

Os ensaios clínicos revisados, que totalizaram 134 pacientes predominantemente ambulantes (que caminhavam), com idades entre 4 e 8 anos, tiveram resultados decepcionantes. Os dois principais estudos (Classe I), considerados de alta qualidade metodológica, falharam em demonstrar melhora estatisticamente significativa na Avaliação Ambulatória North Star (NSAA), o desfecho primário definido pelos pesquisadores para medir eficácia clínica.

Por outro lado, alguns resultados secundários, incluindo melhoras modestas em velocidade na caminhada de 10 metros e redução no tempo para levantar-se do chão, foram observados no grupo tratado. No entanto, devem ser interpretados com cautela devido ao uso concomitante de altas doses de corticosteroides, que por si só já são conhecidos por produzir benefícios motores significativos em pacientes com DMD.

Os ensaios identificaram também efeitos adversos notáveis, como miocardite, hepatotoxicidade, trombocitopenia e episódios frequentes de vômitos, além de um caso fatal de insuficiência hepática aguda registrado fora dos ensaios clínicos.

A decisão regulatória da FDA também gerou críticas intensas. Inicialmente aprovada de forma acelerada em 2023 apenas para crianças ambulantes de 4 a 5 anos, a terapia teve sua indicação ampliada em 2024 para pacientes não ambulantes acima de 4 anos, após uma decisão controversa do diretor do Centro de Avaliação e Pesquisa Biológica (CBER), Peter Marks. Essa decisão contrariou diretamente as recomendações internas dos comitês técnicos da FDA, que consideraram insuficientes as evidências clínicas disponíveis.

Do ponto de vista econômico, o custo elevado de aproximadamente 3,2 milhões de dólares por infusão é alvo de críticas severas. O Instituto de Avaliação Clínica e Econômica (ICER) declarou explicitamente que o preço do tratamento é excessivamente alto para uma terapia que falhou consistentemente em atingir seus objetivos primários de eficácia, não sendo sequer curativa.

Diante deste cenário, especialistas reforçam a necessidade urgente de monitoramento rigoroso dos pacientes, desenvolvimento de infraestrutura clínica adequada, além de novos estudos para avaliar eficácia em longo prazo e definir melhor o momento ideal para intervenção terapêutica. Novas tecnologias, como dispositivos vestíveis para monitoramento contínuo, também são consideradas essenciais para uma avaliação mais precisa e abrangente dos resultados reais da terapia.


Fonte: Delandistrogene Moxeparvovec Gene Therapy in Individuals With Duchenne Muscular Dystrophy: Evidence in Focus / Neurology

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Cláudio Cordovil Pesquisador em Saúde Pública
Jornalista profissional. Servidor Público. Pesquisador em Saúde Pública (ENSP/Fiocruz). Especializado em Doenças Raras, Saúde Pública e Farmacoeconomia . Mestre e Doutor em Comunicação e Cultura (Eco/UFRJ). Prêmio José Reis de Jornalismo Científico concedido pelo CNPq.

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