PL sobre ‘lobby’ vai ao Senado, com alguma transparência e muitas lacunas

A Câmara dos Deputados aprovou no final de novembro o projeto de lei 1202/07 para regulamentar a prática do lobby no Brasil.

Tendo tramitado por 15 anos na Casa, o texto define a atividade como “representação de interesses” a ser exercida por pessoa natural ou jurídica e define regras para garantir a transparência dessas interações, bem como punições para os casos de descumprimento.

Aprovado na Câmara dos Deputados de forma simbólica, o PL segue agora para análise do Senado, onde pode sofrer alterações, antes de ser enviado à sanção presidencial.

Os lobistas profissionais costumam atuar no Congresso com o objetivo de influenciar parlamentares a aprovar ou rejeitar determinados projetos. A prática também é comum em órgãos do governo como ministérios, com foco em políticas públicas que possam beneficiar ou prejudicar determinados setores da economia ou grupos de pessoas.

Motivação do PL: A nova legislação está relacionada a uma exigência da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) para que o Brasil possa ser aceito como integrante do grupo.

Por que 15 anos para aprovar? Porque tais atividades, até então obscuras, estão associadas à prática da corrupção.

A quem se destina: As regras definidas pelo novo PL se destinam a lobistas, mas também a políticos, representantes do governo, agentes públicos e integrantes do Judiciário envolvidos nas negociações.

Quais são as novas exigências: Uma das exigências é que todas as agendas de reuniões sejam divulgadas, inclusive com o assunto abordado e os nomes de todos os participantes envolvidos.Os detalhes dos encontros deverão ser disponibilizados em até quatro dias úteis após a audiência. O registro ficará disponível por cerca de cinco anos.

Quando começa a vigorar: A partir da sanção da lei pelo Presidente da República, os órgãos do Poder Público terão 180 dias para disponibilizar um sistema eletrônico de registro para acesso público.

Penalidades previstas: As entidades ou associações que desobedecerem a lei poderão ser punidas com advertência ou suspensão da atividade profissional.Em caso de descumprimento das regras por agentes públicos, o PL também prevê sanções que vão desde advertência até a perda de mandato, emprego, cargo ou função.

Principais falhas do PL: Não instituir um esquema de cadastro geral obrigatório dos representantes; Não definir agências que fiscalizariam esses lobistas; nem estabelecer com precisão as penas para os lobistas que violarem as normas. O excesso de regras presentes no PL pode travar seu desempenho.

Afinal, vai resolver? O fato de agentes públicos e lobistas terem que informar suas transações deve reduzir o tráfico de influência. Apesar de o PL gerar alguma transparência nas negociações entre políticos e agentes do setor público e privado, ele precisaria sofrer por outros ajustes para ser bem implementado. Faltou definir um órgão fiscalizador para a atividade de lobby.

Participação social zero: Durante a tramitação do projeto na Câmara, um grupo de mais de 50 entidades, como a Transparência Internacional e o Pacto pela Democracia e Observatório do Clima, enviou sugestões de alteração. No entanto, as entidades informaram que nenhuma delas teria sido acatada no texto final. Contudo, profissionais vinculados a essas instituições revelaram ao jornal Folha de S. Paulo que as alterações teriam sido acatadas no relatório elaborado pelo deputado Augusto Coutinho (Republicanos-PE) na Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público. O relatório não avançou devido à aprovação de um requerimento de urgência na Casa, fazendo com que o projeto fosse encaminhado direto ao plenário.

Lobby: atividade em que empresas, entidades, pessoas físicas, segmentos da sociedade agem para viabilizar interesses próprios ou de terceiros nos parlamentos e nos governos

Ouça o comentário de Rita de Cássia Biason, cientista política e coordenadora do Centro de Estudos sobre Corrupção da Unesp, campus de Franca

Lobby e corrupção: duas faces da mesma moeda?

Os maiores escândalos revelados e divulgados pela mídia citam a atuação de lobistas envolvidos em esquemas de desvios de recursos públicos por meio de cooptação de servidores.

Assim, os profissionais da área lamentam ter sua atividade demonizada. Pesquisa realizada pela instituição em 2017, com 157 lobistas, revelou que 66% dos entrevistados responderam acreditar que a profissão não goza de boa reputação junto à opinião pública.

Recentemente, um Brasil estupefato teve notícia de pastores que mediavam acordos entre prefeitos diretamente com o ministro da Educação (MEC), também pastor, Milton Ribeiro. Acredita-se que o escândalo tenha acelerado a regulamentação do lobby.

Em 2016, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados chegou a aprovar o Projeto de Lei 1.202/2007, que neste processo foi apensado à proposta apresentada por Bolsonaro (PL 4.391/2021). Em 2018, o Ministério do Trabalho incluiu a atividade de lobista na lista da Classificação Brasileira de Ocupações. Isto é, a atividade foi reconhecida como profissional de relações institucionais e governamentais. A função se enquadra como “defensor de interesses.

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