A União ajuizou, em 23 de agosto de 2024, a Petição 12.928, em que requer a suspensão do cumprimento de medidas liminares que determinaram a compra do medicamento Elevidys, até que fosse finalizada conciliação entre o laboratório Roche e o Ministério da Saúde (Petição 12.928). Gilmar Mendes (STF) acatou a petição.
A judicialização da saúde no Brasil ocorre quando cidadãos recorrem à Justiça para garantir o acesso a tratamentos médicos, especialmente medicamentos de alto custo.
O problema da judicialização é que ela pode causar um grande impacto no orçamento público, como visto em 2020, quando até 10% dos recursos da saúde destinado à saúde de 13 estados e de metade dos municípios brasileiros foram usados para cumprir decisões judiciais.
Sabemos que o acesso ao tratamento é um direito fundamental, mas que atender a todos os pedidos judiciais pode gerar problemas maiores, como a dificuldade de manter o orçamento de saúde sustentável. Nenhum país do planeta entrega tudo que é reivindicado pela sociedade em termos de recursos de saúde. Não é uma mazela brasileira.
O caso do Elevidys, usado para tratar a distrofia muscular de Duchenne, é exemplar. Ele custa cerca de R$17 milhões por tratamento, e sua judicialização levou o governo a enfrentar decisões judiciais com grande impacto financeiro.
Para evitar um dano ainda maior, o Supremo Tribunal Federal (STF), por meio do ministro Gilmar Mendes, buscou um caminho de conciliação entre o governo e a indústria farmacêutica, criando um diálogo para negociar preços mais acessíveis. O ministro ainda teve a sensibilidade de determinar que crianças próximas de perder a oportunidade de tratamento recebam o medicamento imediatamente, mostrando atenção ao tempo crítico para a eficácia do tratamento.
Desta forma, o STF inaugura uma nova fase na judicialização da saúde, que não é marcada por uma quebra brusca de paradigmas, ou negação de direitos, mas sim por uma postura de conciliação, evitando um ativismo judicial que poderia prejudicar as decisões administrativas e a democracia.
A decisão do STF buscou preservar a legitimidade do sistema legal, equilibrando o direito à saúde com a responsabilidade orçamentária e administrativa do Estado.
“Às vezes é necessário restabelecer o óbvio”
Aldous Huxley
A Petição 12.928:
Audiência de conciliação. Tentativa de resolução ampla da questão relativa ao fornecimento do medicamento Elevidys, em benefício de todos os portadores de Distrofia Muscular de Duchenne (DMD)
O ministro Gilmar Mendes suspendeu decisões provisórias (liminares) da Justiça que autorizaram a compra do medicamento “Elevidys”. O ministro assim atendeu a um pedido da União e isto vale até que seja concluída uma conciliação entre o laboratório responsável pelo medicamento e a União sobre o preço e as condições de aquisição do medicamento, que ainda depende de aval da Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
No momento da suspensão, já haviam sido concedidas 13 liminares para fornecimento do medicamento, sendo que 11 delas ainda não haviam sido cumpridas. A União também explicou que, apenas para o cumprimento das 13 liminares deferidas, haveria um impacto de R$ 252 milhões aos cofres públicos.
Diante da situação, o que fez Gilmar Mendes?
O Ministro Gilmar Mendes designou, em 6 de agosto de 2024, audiência de conciliação entre a União e a farmacêutica Roche Brasil para tratativas sobre o preço e as condições de aquisição do medicamento Elevidys, indicado para tratamento de Distrofia Muscular de Duchenne (DMD).
Ao receber a Reclamação 68.709, ajuizada pelos responsáveis legais de criança portadora da patologia, o Ministro Gilmar Mendes reconheceu a sensibilidade do tema, que envolve não só os interesses legítimos do paciente e de seus familiares, mas também a preocupação, igualmente legítima, dos gestores do SUS com a preservação de recursos suficientes para o atendimento de outras demandas sociais na área da saúde pública.
O Relator acrescentou que todos os portadores da DMD têm direito de receber atenção médica especializada e tratamento adequado para a patologia (e não só Enzo). Registrou, ainda, sua preocupação em buscar uma solução ampla para o fornecimento do remédio a todos os portadores da doença, por meio da rede pública de saúde.
Por isso, designou audiência de conciliação para aproximar as partes envolvidas, sobretudo o Ministério da Saúde e o laboratório, e tentar viabilizar a incorporação da tecnologia no Sistema Único de Saúde, por preços e condições justas.
Uma das soluções possíveis seria a celebração de um acordo de compartilhamento de risco entre o laboratório e o Ministério da Saúde. Por meio deles, as partes negociam preços justos para o produto e, ainda, dividem os riscos relacionados à sua eficácia, condicionando o pagamento do preço total à apresentação de benefícios para o paciente.
A primeira audiência de conciliação foi realizada em 14.de agosto e contou com a presença de representantes do Ministério da Saúde, da Anvisa, da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde – CONITEC, da farmacêutica Roche Brasil, dos hospitais credenciados, do Ministério Público Federal e do autor da reclamação.
Gilmar deixou claro que a decisão não tem o objetivo de revogar as liminares concedidas, mas apenas suspendê-las até a conclusão das negociações, o que poderá beneficiar não só os autores das ações em andamento, mas todas as crianças portadoras de Distrofia Muscular de Duchenne que residem no país.
As partes se comprometeram a trazer propostas na próxima reunião, agendada para 30 de setembro de 2024, às 14h, na Sala de Sessões de Segunda Turma do STF
Como editor de um blog dedicado à reflexão sobre doenças raras, é fundamental destacar que a solução proposta pelo ministro Gilmar Mendes na Petição 12.928 representa um avanço significativo na forma como a judicialização da saúde pode ser tratada no Brasil.
Ao priorizar o diálogo entre o governo e a indústria farmacêutica, sem comprometer o acesso ao tratamento para pacientes em condições críticas, Mendes demonstrou sensibilidade e pragmatismo ao equilibrar os direitos fundamentais com a responsabilidade fiscal. Essa abordagem, que evita o ativismo judicial e favorece a conciliação, sinaliza um caminho mais sustentável e democrático para a garantia do direito à saúde.
Para todos os pacientes elegíveis para a terapia (e não para alguns que têm condição de judicializar e pagar advogados) , a solução proposta pelo Ministro Gilmar Mendes no sentido de convocar as partes a uma conciliação inaugura um precedente virtuoso nas relações entre direito à saúde e democracia.